Teoria dos conjuntos/Explorando os axiomas da extensão, separação, par e união: diferenças entre revisões

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Linha 30:
Uma pergunta natural é quais relações que existem com ''A'' como conjunto de partida e ''B'' como conjunto de chegada? O conjunto vazio é o gráfico de uma destas relações; analogamente, se ''A'' e ''B'' não forem vazios, com <math>a \in A, b \in B\,</math>, temos que ''G = { (a, b) }'' é o gráfico de uma relação.
 
Será que existe uma relação cujo gráfico inclua '''todos''' pares ''(x, y)'', com <math>x \in A, y \in B\,</math>? Em outras palavras, existe o conjunto (porque, usando o axioma da extensão, se ele existe, então é único) <math>A \times B\,</math> com a propriedade notável que <math>(x, y) \in A \times B \iff x \in A \land y \in B\,</math>? A resposta, com base nos axiomas até agora apresentados, é um terrível '''não sei'''. Esta pergunta será respondida afirmativamente com o axioma da potência.
 
== Funções ==
Linha 39:
O problema é que ainda faltam alguns axiomas para podermos construir várias funções. Por exemplo, seja ''A'' um conjunto qualquer, e ''B'' um conjunto de um único elemento, ''B = { b }''. Será que existe uma função <math>f: A \to B\,</math>? Intuitivamente, este conjunto seria formado pelos pares ''(x, b)'' em que <math>x \in A\,</math> - porém já vimos que a expressão <math>\{ x | \Phi(x) \}\,</math> pode não definir um conjunto, e o que estamos tentando fazer é definir esta função como <math>\{ (x, b) | x \in A \}\,</math> - exatamente desta forma "proibida".
 
== Conjuntos infinitos e conjuntos finitos ==
== Relação bem ordenada ==
Seguindo a definição de {{w|Richard Dedekind|Dedekind}}, um conjunto ''S'' '''infinito''' quando:
: <math>\exists A, f: A \to S, (A \subset S \land \mbox{ f é bijetiva })\,</math>
Um conjunto que não é infinito é um conjunto finito.
 
Serão mostrados agora alguns conjuntos finitos. Um conjunto infinito só pode ser mostrado com os axiomas seguintes.
== Conjuntos finitos ==
 
É óbvio que <math>\varnothing\,</math> é um conjunto finito, porque não possui nenhum subconjunto próprio.
== Números ordinais ==
 
Seja ''S'' um conjunto unitário (ou seja, <math>\exists s, S = \{ s \}\,</math>, seja <math>A \subset S\,</math> e <math>f: A \to S\,</math> uma função bijetiva. Mas o único subconjunto próprio de ''S'' é o conjunto vazio, e a única função <math>f: \varnothing \to S\,</math> é a função cujo gráfico é o conjunto vazio, portanto não existe ''(x,y)'' no gráfico de ''f'' tal que ''y = s'' - em outras palavras, ''S'' não é infinito.
== Números naturais ==
 
Podemos prosseguir, mostrando vários casos particulares de conjuntos finitos (por exemplo, que ''{x,y}'' é um conjunto finito), mas as provas mais gerais precisam de outras construções (composição de função, produto cartesiano, etc), que dependem dos próximos axiomas - por exemplo, não dá para mostrar que um subconjunto de um conjunto finito é também um conjunto finito!
 
 
== Número natural ==
Como vimos anteriormente, definimos <math>0 = \varnothing\,</math>, ''1 = { 0 }'', ''2 = { 0, 1}'', e prosseguimos definindo até ''9 = {0, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8}''. Pode-se imaginar (mas não escrever - a notação não é suportada pela linguagem da teoria dos conjuntos) que um '''número natural''' é um conjunto da forma ''n = {0, 1, 2, ... n-1}''. O desafio agora é como escrever isto na linguagem da teoria dos conjuntos.
 
Imediatamente, vemos que o conjunto vazio é um número natural. Então vamos colocar isto na definição.
 
Além disso, todo número natural diferente do zero é o ''sucessor'' (definido por <math>s(x) = x \cup \{ x \}\,</math>) de outro número natural, que é um elemento seu.
 
Mas um pouco de imaginação mostra que esta definição esboçada acima como uma propriedade <math>\Phi(x)\,</math>:
: <math>x = \varnothing \lor \exists y \in x (x = y \cup \{ y \})\,</math>
dá margem a conjuntos ''bem'' maiores que os números naturais - veremos adiante que conjuntos são esses.
 
Mas se incluirmos que todos elementos de ''x'' tem esta propriedade <math>\Phi(x)\,</math>, chegamos à seguinte:
: <math>\Phi(x) \land \forall y \in x, (\Phi(y))\,</math>
 
Neste momento seria tentador resumir esta propriedade como <math>n \in \mathbb{N}\,</math>, mas a existência de um conjunto dos números naturais deve ser adiada para um axioma seguinte - o axioma do infinito. Por enquanto, a propriedade acima será resumida com <math>\mathbf{N}(n) = \Phi(n) \land \forall y \in x, (\Phi(y))\,</math>
 
Outros resultados importantes não são possíveis sem que antes se exclua a possibilidade de conjuntos da forma ''Q = { Q }''. Este conjunto, se existisse, seria chamado de {{w|Átomo de Quine}}), e teria a propriedade desagradável de ser o sucessor dele mesmo
(<math>s(Q) = Q \cup \{ Q \} = Q \cup Q = Q\,</math>), sendo, portanto um número natural -mas, conforme vimos pela construção intuitiva, seria interessante que um número natural fosse da forma ''{0, 1, 2, ... n-1}'' e não desta forma patológica. Um conjunto como ''Q = { Q }'' é chamado de conjunto não-bem-fundado, e existe um axioma, o axioma da fundação ou axioma da regularidade que exclui estes conjuntos da Teoria que estamos estudando.
 
=== O sucessor de um número natural é um número natural ===
 
Vamos verificar se os números 0, 1, 2, ... 9 são números naturais.
 
É óbvio que <math>0 = \varnothing\,</math> é um número natural.
 
Pode-se demonstrar que se ''n'' é um número natural, então ''s(n)'' também é. A prova:
 
: Suponha que ''n'' é um número natural. Então temos para ''s(n)'':
:: <math>s(n) = n \cup \{ n \} \implies \exists n \in s(n) (s(n) = n \cup \{ n \}\,</math>
: Portanto verifica-se que <math>\Phi(s(n))\,</math>.
:
: Por outro lado, se <math>y \in s(n)\,</math>, então <math>y = n \lor y \in n\,</math>. Em ambos casos, temos que <math>\Phi(y)\,</math> - o que completa a prova de que ''s(n)'' é um número natural.
 
Com isso, provamos que 1 é um número natural. Com isso, provamos que 2 é um número natural. E a repetição deste argumento mostra que 3, 4, 5, 6, 7, 8 e 9 são número naturais.
 
 
== Relação bem ordenada e número ordinal ==
Uma relação de ordem ''((A, A), R)'', na qual <math>(x, y) \in R\,</math> será representado por ''x < y'', é dita '''bem ordenada''' quando:
* <math>\forall x, y, z \in A, (x < y \land y < x \implies x < z)\,</math> (transitividade)
* <math>\forall x \in A, (\neg x < x)\,</math> (aliorrelatividade)
* <math>\forall x, y \in A, (x < y \lor x = y \lor y < x)\,</math> (ordem total)
* <math>\forall S \subseteq A, (\exists s \in S \implies \exists i \in S, (\forall x \in S, (i = x \lor i < x)))\,</math> (bem-ordenação: todo subconjunto não vazio tem um elemento mínimo)
 
Usando a definição de von Neumann, um conjunto &alpha; (costumam-se usar letras gregas para os números ordinais) é um número ordinal quando:
* Existe uma relação bem ordenada ''((&alpha;, &alpha;), R)''
* Esta relação satisfaz <math>\forall x, y \in \alpha, ((x,y) \in R \iff x \in y)\,</math>
* Todo elemento de &alpha; é um subconjunto de &alpha; (ou seja, <math>\forall x \in \alpha, (x \subseteq \alpha))\,</math>
 
Será usada a representação '''Ord(&alpha;)''' para indicar que ''&alpha;'' é um número ordinal (de von Neumann).
 
Pode-se provar que, se ''y'' e ''z'' são elementos do ordinal ''&alpha;'', então <math>y \subseteq z \lor z \subseteq y\,</math>.
 
Prova: sem perda de generalidade, podemos supor <math>y \in z\,</math> (<math>z \in y\,</math> é a mesma prova, trocando ''y'' por ''z'', e ''y = z'' é imediato). Então seja <math>x \in y\,</math>. Pela propriedade transitiva, temos que <math>x \in z\,</math> - em outras palavras, <math>\forall x \in y, (x \in z)\,</math> - ou seja, <math>y \subseteq z\,</math>.
 
=== Se um ordinal não é o conjunto vazio, então o conjunto vazio é seu elemento ===
Ou seja, <math>\forall \alpha, Ord(\alpha) \land \exists y \in \alpha \implies \varnothing \in \alpha\,</math>
 
Como o próprio &alpha; é um subconjunto não-vazio dele mesmo, então ele tem um elemento mínimo ''z''.
 
Suponha que <math>\exists x, x \in z\,</math>. Neste caso, por ''z'' ser um elemento de &alpha;, temos que ''z'' é um subconjunto de ''&alpha;'', ou seja, <math>x \in \alpha\,</math>. Mas como ''z'' é mínimo, temos que ''z = x'' (violando a aliorrelatividade) ou <math>z \in x\,</math> (e, aplicando a transitividade, recaimos em <math>z \in z\,</math>).
 
Ou seja, a única forma de ''&alpha;'' ter um elemento mínimo é este elemento ser o conjunto vazio.
 
=== Todo elemento de um número ordinal é um número ordinal ===
 
É imediato mostrar que, se ''Ord(&beta;)'' e <math>\alpha \in \beta\,</math>, então ''Ord(&alpha;)''.
 
A prova parte da construção da relação ''((&alpha;, &alpha;), Ra)'' definida a partir da relação de ordem ''((&beta;, &beta;), Rb)'', definindo o gráfico ''Ra'' como um subconjunto de ''Rb'':
: <math>R_a = \{(x,y) \in R_b | x \in \alpha \land y \in \alpha \}\,</math>
 
Então temos:
* Se <math>x \in \alpha\,</math> então, como elementos de ''&beta;'', pela transitividade, todo elemento de ''x'' será também elemento de ''&alpha;'' - provamos que todo elemento de &alpha; é um subconjunto de &alpha;
* Se ''x'', ''y'' e ''z'' são elementos de ''&alpha;'' então são elementos de ''&beta;'', o que prova a transitividade
* Se ''x'' é um elemento de ''&alpha;'' então também é elemento de ''&beta;'', o que prova a aliorrelatividade
* Se ''x'' e ''y'' são elementos de ''&alpha;'' então são elementos de ''&beta;'', o que prova a ordem total
* Se ''S'' é um subconjunto não-vazio de ''&alpha;'', então também é um conjunto não-vazio de ''&beta;'', portanto tem elemento mínimo.
 
=== Outras provas ===
 
Várias provas importantes sobre os números ordinais (por exemplo, se ''&alpha;'' é um número ordinal então ''s(&alpha;)'' também é um número ordinal) precisam dos próximos axiomas, especialmente o axioma da potência.
 
== Próximos capítulos ==
Os próximos capítulos foram escritos de forma que possam ser estudados de forma independente. Em cada um deles, é apresentado um axioma, e os conceitos aqui introduzidos são um pouco expandidos, com novas provas.
 
Na seção seguinte, todos os axiomas são supostos, e estes temas serão revistos e aprofundados.
 
Os axiomas são:
* [[/Axioma da potência/]]
* [[/Axioma da substituição/]]
* [[/Axioma da regularidade/]]
* [[/Axioma do infinito/]]
* [[/Axioma da escolha/]]