Português/Morfologia(2): diferenças entre revisões

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''' 1. INTRODUÇÃO '''
 
Modernamente, observamos que os alunos de 1º e 2º graus utilizam gramáticas em seu estudo da língua, mas para nossa preocupação, essas não possuem, quase sempre, base científica por não se basearem em estudos lingüísticos.
 
É importante para nós que um estudo gramatical tenha uma relevância lingüística e, por isso, resolvemos fazer um trabalho que mostre o atual conteúdo de morfologia estudado nas escolas e uma alternativa de conteúdo mais racional, embasado em princípios científicos.
 
Inicialmente, proporemos um conceito de morfologia, passando à diferença entre vocábulo e palavra, uma vez que tais termos são usados indistintamente pelos gramáticos, chegando, enfim, ao problema crucial: o que são classes e o que são funções dos vocábulos?
 
O objetivo deste trabalho é aprofundar teorias científicas que justifiquem uma alteração significativa no conteúdo ministrado, hoje, no estudo morfológico, tornando o ensino gramatical mais racional e científico.
 
É também objetivo do trabalho fazer um estudo critico sobre a validade do atual estudo de morfologia em nossas escolas hoje, como também a necessidade de se produzir um manual que oriente docentes e discentes no estudo morfológico.
 
Entre as hipóteses levantadas, acreditamos ser a de maior relevância a diferenciação entre o que seja classe gramatical e o que seja função gramatical. As gramáticas atuais dividem os vocábulos atuais em dez classes gramaticais, enquanto tentaremos justificar a existência de apenas três classes gramaticais e outras três funções.
 
Outra hipótese é a falta de base científica nos estudos gramaticais de nossas escolas. Os estudos gramaticais são prescritivos e não conseguem dar respostas a questionamentos simples, como, por exemplo, por que classificamos o vocábulo menino como substantivo quando ele pode funcionar como adjetivo?
 
Para fazer este estudo, tomamos como referência maior a teoria do professor José Lemos Monteiro, em seu livro "Morfologia Portuguesa", e os estudos do professor Mattoso Câmara Júnior, em seu livro "Princípios de Lingüística Geral", por entendermos ser o que de mais racional existe hoje em termos de morfologia.
 
Este trabalho coloca as teorias gramaticais prescritivas e, em seguida, contrapõe-na com as teorias lingüísticas, num trabalho de pesquisa bibliográfica, acrescido do ponto de vista defendido na hipótese, sexto parágrafo dessa introdução.
 
Acreditamos ser este trabalho de profunda relevância, pois permitirá aos profissionais da área uma reflexão acerca dos conteúdos hoje ministrados em nossas escolas e a necessidade de se criar manuais que possibilitem um melhor ensino de morfologia, objetivando um melhor aproveitamento de nossos discentes.
 
'''POR ANÍBAL DANTAS'''
 
'''2.ENTENDENDO MORFOLOGIA E SEU ESTUDO'''
 
Ao formularmos a pergunta "para que se dá aulas de português a falantes nativos do português?" (Travaglia, 1996, pág. l7), encontraríamos, por certo, respostas diferentes, de acordo como o professor ministra seus conteúdos.
 
Numa visão geral, os professores, hoje, preocupam-se demasiadamente com as regras impostas por gramáticas, chamados, por isso, de professores prescritivos, ou seja, preocupam-se apenas em transmitir regras impostas por gramáticas consagradas em nosso país, mas que não possuem base científica. Para esses professores, a resposta à indagação acima deverá tomar por base a NGB (Nomenclatura Gramatical Brasileira), lei criada, em 1971, e que rege a nossa língua oficial.
 
Entretanto, existem alguns profissionais da área que tentam discutir o funcionamento de nossa língua, munindo o seu aluno de conhecimento para o entendimento da língua como instrumento de comunicação e ascensão social. Para eles, a língua tem uma estrutura e regras de funcionamento, por isso, tem que ser entendida criticamente. Esses responderão à indagação com base em teorias lingüísticas.
 
Daí viriam, certamente, divergências entre os gramáticos e os lingüistas em várias áreas da língua portuguesa. Em nosso caso, interessa-nos, apenas, a morfologia.
 
Não raramente, os gramáticos prescritivos não fazem distinção entre os termos palavra e vocábulo. Por vocábulo, entendemos todo conjunto de fonemas empregados no uso das línguas, mas somente aqueles dotados de semantema (raiz, de acordo com José Lemos Monteiro, radical, de acordo com Ernani Terra) podem ser considerados palavras, ou seja, as palavras pertencem ao reino dos vocábulos.
 
Uma definição que considera o artigo como "palavra que antecede o substantivo" (Sacconi, 1990, pág. 144) certamente não levou em consideração o fato de o, a, os, as, um, uma, uns, umas não ter semantema e, por isso, não é palavra, mas apenas vocábulo.
 
Uma questão inicial para o nosso estudo é: o que estuda a morfologia? A palavra morfologia vem do grego e significa o estudo da forma (em seu sentido literal) ou estudo da figura, como salienta Napoleão Mendes Almeida. Tem como objetivo o estudo da estrutura e dos processos de flexão e formação dos vocábulos, bem como a classificação dos vocábulos.
 
Observemos, agora, o que dizem os gramáticos prescritivos de morfologia:
 
"Segunda parte da gramática (...) (gr. Morphê=figura + logias=estudo), que trata das palavras:
a) quanto à sua estrutura e formação;
b) Quanto às suas flexões;
c) Quanto à sua classificação."
(Almeida, 1983, pág. 80)
 
"Disciplina que se ocupa do sistema morfológico da língua, do aspecto formal das palavras, vem do grego morphê+log(os)+ia= tratado, estudo das formas.
 
Distinguem-se duas morfologias:
1)A propriamente dita, morfologia em sentido restrito (...), que se ocupa
de problemas gramaticais, flexões, etc.;
2) A impropriamente dita, morfologia em sentido lato (...), que trata de
problemas lexicais, como estrutura, formação e sentido das palavras, etc.
segundo a NGB, a morfologia trata das palavras:
a) Quanto a sua estrutura e formação;
b) Quanto a suas flexões; e
c)Quanto a sua classificação.
 
Luft, 1989 pág. 71)
 
Como vemos, as duas definições, de Almeida e Luft, não diferem quanto ao campo de estudo da morfologia, utilizam o termo palavras ao invés de vocábulos e pregam a norma estabelecida pela NGB (sem contestação), o que nos leva a deduzir serem as gramáticas prescritivas meros modelos de reprodução, sem nenhuma postura crítica.
 
Não estamos aqui dizendo com isso que a NGB não tenha sido um avanço, pois, no Brasil, havia várias "gramáticas diferentes e a NGB representou um excelente passo para se combater o arbítrio e a fantasia individual em matéria de nomenclatura" (Câmara Jr, 1972). Cada professor criava sua nomenclatura e passava a ser um problema em termos de uniformidade, pois "no Brasil, que é a terra da gramática, todo professor de português se acha obrigado a criar uma nomenclatura gramatical sua" (Câmara Jr., 1972), a exemplo da Alemanha, terra dos filósofos, onde "todo filósofo cria seu próprio sistema filosófico" (Câmara Jr., 1972).
 
O que se critica na NGB é a concepção gramatical sem embasamento lingüístico onde "não raro procedeu com timidez (...) não assumir atitudes doutrinárias radicais levou-a a certas incoerências e à manuntenção, em alguns casos, de certos pontos de vista superados" (Câmara Jr., 1972).
 
Já os lingüístas diferem bastante dos gramáticos prescritivos e entre si, no conceito e campo de estudo da morfologia. Observemos alguns conceitos de lingüístas:
"A morfologia trata da estrutura e dos processos de flexão e formação das palavras. Cabe-lhe ainda, segundo as gramáticas, a tarefa de classificar os vocábulos".
(Monteiro, 1991, pág. 203)
 
"A gramática tradicional distinguia a morfologia da sintaxe, de acordo com o critério das dimensões relativas dos significantes. Assim, caberia à sintaxe estudar as construções superiores à palavra (locuções, frases, etc.), nas quais a palavra fosse a unidade constituinte mínima) e caberia à morfologia efetuar o estudo das construções cujos constituintes mínimos fosse palavras, ou partes de palavras (sufixos, raízes, etc.) . Os lingüístas da atualidade (...) apontam as sobreposições freqüentes entre os dois setores e recusam-se a distingui-los; a sintaxe, para eles, começa a partir do encontro de dois morfemas (parecer de Pottier), e seria mais apropriado falar-se nesse caso, em morfossintaxe".
(Lopes, 1995, pág. 150)
 
"Trata dos morfemas e sua estruturação no vocábulo (sintagma lexical)
(Câmara Jr., 1996, pág 130)
 
Como se percebe, Monteiro e Câmara Jr. concordam ao reconhecerem na morfologia o estudo dos morfemas, deixando de lado o estudo das classes de palavras, que, para Monteiro, deve ser dividido em classes e funções, como veremos no capítulo seguinte. A grande divergência é em relação a Lopes, que não reconhece o estudo morfológico, acreditando ser a junção de dois morfemas campo de estudo da morfossintaxe, pois já evidencia a função e o aspecto semântico.
 
O nosso estudo não se prenderá aos morfemas, mas ao aspecto das chamadas classes gramaticais, que no entender da lingüística deve ser abordado numa perspectiva semântica e funcional, abrangendo uma parte da sintaxe.
 
'''3. DISCUTINDO CLASSES E FUNÇÕES DAS PALAVRAS'''
 
Como vimos, a grande preocupação dos lingüistas é tornar o estudo da gramática mais racional e crítico, embasado em teorias que possibilitem um conhecimento da língua a partir de sua estrutura funcional e semântica.
 
Para Mattoso Câmara Júnior, a melhor maneira de dividir os vocábulos formais portugueses é o critério morfossemântico, pois o sentido só pode ser definido com o auxílio da forma. A partir daí, teríamos três tipos de vocábulos formais: nomes, verbos e pronomes, sendo essas as classes dos vocábulos, não as funções.
 
Por classe entendemos a sua função morfológica propriamente dita, dependendo dos seus constituintes morfemáticos, como os nomes, verbos e pronomes (como veremos no capítulo destinado às classes); para designar o nome por exemplo, em substantivo ou adjetivo, dependemos de sua função dentro do contexto frasal (sintaxe). Daí que um substantivo (função) pode ser representado por um nome (classe) ou por um pronome (classe). Por exemplo:
 
O '''brinquedo''' é meu (substantivo representado por nome).
 
'''Isso''' é meu (substantivo representado por pronome).
 
Contrária a esse pensamento, a NGB considera dez classes de "palavras", divididas em dois grupos: variáveis (substantivo, adjetivo, pronome, artigo, numeral e verbo) e invariáveis (advérbio, preposição, conjunção e interjeição). Todos os chamados livros didáticos suportam essa classificação. Destacamos o termo didáticos por entendermos prescindir a didática de uma metodologia científica ou filosófica, não encontrando em tal classificação embasamento científico ou filosófico que a justifique.
 
Luís Antônio da Silva preocupou-se com uma gramática embasada nos princípios lingüísticos, principalmente Francisco Borba e Evanildo Bechara, com aspectos da NGB, principalmente Celso Cunha e Evanildo Bechara, e classificou como nome apenas o substantivo (argumentando ser o substantivo o nomeador dos seres em geral) e compara o substantivo ao centro do sistema solar, cercado pelos termos determinantes, como artigo, pronome, numeral e adjetivo. Silva considera o substantivo como um nome determinado e o artigo, adjetivo, pronome e numeral como determinantes, que vivem em função do núcleo central.
 
Não se pode negar um avanço do gramático Silva em determinados pontos, mas falta-lhe uma definição melhor do papel do artigo, considerar que o pronome e o numeral podem funcionar como termos determinados (substantivos), situações que abordaremos mais à frente no presente trabalho, mas já se abre uma luz no universo eclíptico dos gramáticos tradicionais ao reconhecer o substantivo como determinado e o adjetivo como determinante, bem como a terminologia nome, ainda que só para o substantivo.
 
Um erro cometido por silva e por quase a totalidade dos gramáticos é considerar o artigo como palavra, uma vez que não apresenta base significativa (semantema); tal erro se estende a outras classes, como a conjunção e a interjeição.
 
Luís Antônio Sacconi expõe em sua gramática uma classificação independente das classes gramaticais, intitulada palavras e locuções denotativas e a elas não atribui classe gramatical nem função sintática. São dezoito tipos, assim distribuídos:
- Adição. Ex.: A senhora não trabalha e ainda reclama!?
- Afastamento. Ex.: Vou embora daqui.
- Afirmação. Ex.: Com certeza você já sabe das minhas intenções.
- Aproximação. Ex.: Esse rapaz já é quase doutor.
- Coincidência. Ex.: Logo eu fui ser escolhido.
- Continuação. Ex.: Ora, o acusado se diz pai da criança. Em sendo pai da Criança, esta é sua filha.
- Distribuição. Ex.: cada paixão é, a princípio, como um mendigo; em seguida, como um hóspede e, finalmente, como o dono da casa.
- Exclusão. Ex.: Ela olhou só para mim, apenas para mim.
- Explicação. Ex.: Admiro apenas duas forças no mundo: a força física e a inteligência, isto é, as duas únicas formas de energia.
- Freqüência. Ex.: Você, sempre você.
- Inclusão. Ex.: Até você, Brutus!?
- Negação. Ex.: Que esperança! Ela não volta nunca mais!
- Precisão. Ex.: Cheguei às oito horas em ponto.
- Realce. Ex.: As crianças devem Ter ficado com a avó, sei lá.
- Restrição. Ex.: Sua tese é relativamente bem arquitetada.
- Retificação. Ex.: Foram assaltados por um mascarado, aliás, por dois.
- Seleção. Ex.: Gosto do Brasil, principalmente da Bahia.
- Situação. Ex.: Mas quem é essa pessoa que insiste em falar comigo ao Telefone?
 
(Sacconi, 1990-adaptação, pág. 120/124)
 
Achamos incoerência nessa classificação por considerarmos injusto criar uma classe para um vocábulo com apenas um morfema (artigo) e não criar uma classe para as palavras denotativas, muito menos atribuir função sintática à maioria dos vocábulos e não para as palavras denotativas. Outra incoerência é considerar o advérbio uma palavra que exprime circunstância e não considerar circunstancial a seguinte forma: "com certeza você já sabe das minhas intenções" (Sacconi, 1990, pág. 121).
 
Luís Antônio Sacconi diverge da NGB na questão da interjeição; acredita o gramático que, por exprimir emoção ou sentimento repentino, não constitui a interjeição uma classe, uma vez que qualquer palavra, expressão ou oração pode, proferida com entonação característica, tornar-se interjeição ou locução interjeitiva: "Deus me livre!", "Nossa Senhora!". Concordamos com o gramático de não se tratar de uma classe gramatical, mas divergimos quando considera a conjunção uma palavra, quando deveria usar frases de situação.
 
Uma grande incoerência da NGB e seus gramáticos de plantão é a classificação do grau como flexão, como no exemplo:
 
"Os substantivos são flexíveis (...) podem flexionar de três maneiras diferentes:
a) Quanto ao gênero;
b) Quanto ao número e
c)Quanto ao grau."
(Almeida, 1983, pág. 97)
 
Ora, se o grau é flexão, então o advérbio, que varia quanto ao grau, não pertenceria ao grupo das palavras invariáveis, mas das variáveis.
 
Ernani Terra só admite duas flexões para o substantivo: o gênero e o número; entretanto estuda o grau no mesmo item destinado à flexão dos substantivos sem nenhuma referência a alguma classificação diferente, provocando confusão e até incoerência em seu pensamento.
 
'''4. AS CLASSES DOS VOCÁBULOS'''
 
O nome, tanto quanto o verbo, é um vocábulo que possui semantema, por isso, classifica-se como palavra. Se tivéssemos o semantema am-, poderíamos Ter o nome o amo (senhor) ou o verbo eu amo; o que caracteriza principalmente o nome são as suas desinências (de gênero e/ou de número), da mesma forma, o verbo é caracterizado por suas desinências (modo-temporal e/ou número-pessoal).
 
No caso de o amo (senhor), existe a possibilidade de oposição em singular e plural (por exemplo, os amos). No caso de verbo, existe a possibilidade de oposição em número e pessoa (por exemplo, amais) ou em modo e tempo (por exemplo, amava). Qualquer pessoa que já estudou flexão verbal reconheceria cearíamos como forma verbal de cear, pela incidência da desinência modo-temporal -ria- e da desinência número-pessoal -mos, além do conhecimento em vogal temática -a-. Também reconheceria os nomes, quem já estudou flexão nominal, meninas bonitas pela incidência das desinências nominais de gênero -a- e de número -s. Numa perspectiva semântica, os verbos atualizam representações dinâmicas, enquanto os nomes traduzem visões estáticas.
 
Já os pronomes se opõem aos nomes mais pelo sentido (aspecto semântico) do que pelo aspecto mórfico. Poderíamos induzir ao aluno a ausência de expressão de grau para os pronomes e própria para os nomes, mas a real diferença é que os pronomes possuem sentido dêitico, ou seja, "não designam pessoas, coisas, conceitos ou qualidades em geral (como fazem os nomes), mas, sem limitação a uma dada categoria de idéias, denotam um indivíduo específico ou indivíduos específicos de qualquer categoria" (Câmara Jr., 1977), ou seja, os pronomes indicam, enquanto que os nomes representam.
 
Leonor Scliar Cabral, lingüista, estabelece três critérios para classificar as partes do discurso num mesmo conjunto de itens que apresentam o mesmo comportamento nas estruturas (nível sintático): posição, co-ocorrência e comutabilidade. Daí a lingüista retira três classes: os nomes, os verbos e as preposições. Não concordamos com a respeitada lingüista quanto à preposição, que para nós não constitui palavra, mas simplesmente um conectivo subordinativo de palavra, como em o livro de Pedro.
 
Para nós, o que existem realmente são três classes gramaticais, sendo o nome, representado pelas desinências de gênero e de número, o verbo, representado pelas desinências modo-temporal e número-pessoal, e o pronome, com seu sentido dêitico.
 
'''5. AS FUNÇÕES DO VOCÁBULO'''
 
Para iniciar essa discussão, cumpre-nos dizer que as funções exercidas pelas classes dos vocábulos dependem de um critério sintático, das relações sintagmáticas e paradigmáticas exercidas .
Por relação sintagmática, vejamos essa definição:
"A dependência que existe entre dois elementos seqüenciais de uma mesma cadeia chama-se relação (dependência, função) sintagmática (de sintagma: conjugado de duas unidades consecutivas onde o valor de cada um se define por relação ao valor da outra)."
(Lopes,1995, pág. 88)
 
Por paradigma, Lopes, baseado nos estudos de Mattoso Câmara Jr., diz:
"Um paradigma é uma classe de elementos que podem ser colocados no mesmo ponto de uma cadeia, ou seja, são substituíveis ou comutáveis".
(Lopes,1995, pág. 90)
 
O substantivo é, numa relação sintagmática, o elemento e o adjetivo, o elemento determinante, senão vejamos:
Menino pobre
percebe-se que "menino", dentro do sintagma nominal, é determinado por "pobre", que é determinante; portanto, "menino" é um substantivo e "pobre", um adjetivo. Se antepusermos o vocábulo "este" ao sintagma nominal, obtém-se:
 
Este menino pobre
onde, novamente, "menino" é determinado, só que agora por dois determinantes: "este", que estabelece coordenadas geográficas, e "pobre", que situa o seu nível sócio-econômico, portanto, "este" e "pobre" são adjetivos e "menino" é o substantivo.
 
Se colocarmos essas palavras num eixo paradigmático, obteremos:
. . .
. . .
. . .
algum . de Crato
meu . inteligente
o . branco
este menino pobre
qualquer . que caiu
um . de José
. . com quem falei
. . .
. . .
. . .
 
Percebe-se que qualquer vocábulo que substituir este, exercerá a função de adjetivo, o mesmo acontecendo com pobre.
 
Engana-se, porém, quem acredita que os pronomes só podem ser termos determinantes (adjetivos); numa construção como:
 
"Não disse um isto de prosa"(Graciliano Ramos).
 
"isto" é determinado por "de prosa" e por "um", funcionando como substantivo, tendo as formas "de prosa" e "um" função de adjetivo. Em
 
este é meu
"este" é determinado por "meu", sendo este substantivo e "meu", adjetivo.
 
'''6. CLASSE E FUNÇÃO'''
 
Conforme observamos, não se pode confundir classe gramatical com função. As classes gramaticais são obtidas pelas desinências características ou pelo sentido dêitico, enquanto que a função é obtida pelo critério sintático, de acordo com a função exercida pelo vocábulo no sintagma, pela relação entre os termos da frase.
 
Para facilitar a compreensão do problema e permitir uma análise onde colocaremos a nossa proposta, vamos expor as dez classes gramaticais propostas pela NGB e, em seguida, analisá-las, buscando diferenciar as classes e funções propostas pelos lingüistas.
a) Substantivo
 
Para a NGB, é a classe que designa os seres em geral, ou
"O substantivo é o nome de todos os seres que existem ou que imaginamos existir".
(Sacconi, 1990, pág. 124)
 
Primeiro, o substantivo não é classe, mas função, e, segundo, o que são seres? Em "isto não está certo", isto é um ser? É um nome de um ser que existe ou imaginamos existir?
 
O substantivo é pois um termo que dentro de um sintagma nominal é determinado por um adjetivo, como por exemplo,
 
Menina bonita
onde bonita determina menina, que é substantivo. Em
 
isto não está certo,
isto é determinado pelo adjetivo certo, com circunstância negativa, funcionando como substantivo.
 
b) Adjetivo
 
Para a NGB, adjetivo é a palavra que expressa qualidade
"É a palavra (...) que caracteriza o substantivo, indicando-lhe qualidade, estado, modo de ser ou aspecto".
(Terra, 1991, )
 
Critica-se, aqui, o estudo do adjetivo dentro das classes de palavras, quando, na verdade, o adjetivo, tanto quanto o substantivo, são funções. No sintagma meninas bonitas, encontramos nos dois vocábulos a mesma desinência de gênero -a- e a mesma desinência de número -s. Tais desinências caracterizam os vocábulos pertencentes à classe dos nomes. O que difere as duas palavras é sua relação funcional, onde bonita caracteriza e menina é caracterizada, exercendo bonita a função de adjetivo e menina a função de substantivo.
 
Terra (1991), em sua gramática, tentando dar um cunho mais didático e abrangente, tentou captar semanticamente todas as significações do adjetivo, o que complica ainda mais o seu estudo, uma vez que não preenche todas as funções semânticas, já que o gramático não leva em consideração os eixos sintagmático e paradigmático.
 
c. Artigo
 
Para a NGB,
 
"Artigo é a palavra que serve para determinar ou indeterminar o substantivo".
(Saviolli,1994, pág. 273)
 
Causa-nos estranheza a classificação do artigo como palavra, uma vez que o mesmo não possui valor semântico próprio, não possui sequer um semantema, sendo, apenas, um vocábulo. Estranha-nos, ainda, sua classificação como artigo, uma vez que não passa de um pronome, visão amplamente defendida por José Lemos Monteiro, em livros e artigos.
 
Em artigo para a Revista de Letras, publicação veiculada pela Universidade Federal do Ceará, em 1978, Monteiro apóia sua tese sob dois enfoques: o diacrônico e o sincrônico.
 
Diacronicamente, o artigo o e suas formas derivam diretamente das formas illum, illam, as mesmas que produziram os pronomes demonstrativos homônimos. Frize-se que a nossa gramática tradicional é uma cópia dos modelos gramaticais "herdado dos estudos gregos e romanos (...) sem respeitar o princípio de que cada língua forma o seu próprio sistema" (Monteiro, 1978, pág. 44). No latim, onde se originou o "artigo" o e suas formas, não há artigo. As formas masculino e feminina ille e illa, bem como a forma neutra illud, formaram, em português, pronomes demonstrativos e pronomes pessoais do caso reto e oblíquo, além do "artigo".
 
Sincronicamente, os nomes, responsáveis pelo campo representativo da linguagem, constituem símbolos, com valor definido, enquanto que os pronomes servem apenas para fixar o campo mostrativo da linguagem (geralmente dêiticos), valem como sinais, como coordenadores de tempo e espaço. Se o observarmos paradigmaticamente uma relação entre o pronome e o suposto artigo, verificaremos que tanto semanticamente quanto estruturalmente os dois se equivalem.
 
. . .
. . .
. . .
Algum . .
Meu . .
Este . .
O menino bonito
Qualquer . .
Um . .
Novo . .
. . .
. . .
. . .
 
Portanto, consideramos o artigo (conforme classificação da NGB) como um coordenador de tempo e espaço com função dêitica e o classificamos, numa visão lingüística, como pertencente à classe dos pronomes, com função de adjetivo.
d) Numeral
 
De acordo com um gramático tradicional, numeral
"é a palavra que dá idéia de número".
(Sacconi, 1990, pág. 168)
 
Essa definição parece-nos bastante limitada, uma vez que pode ser perigoso criar uma classe por transmitir idéia de. Nesse caso, criaríamos uma classe denominada de passado, por dar idéia de passado (velho, antigo, anterior, antes, etc.).
 
Concebemos uma visão diferente da NGB com o numeral desempenhando uma função e pertencendo a uma classe por critérios estruturais, como nas frases abaixo:
 
I- Dois homens morreram.
 
II- Dois é par.
 
Na frase I, dois funciona como determinante de homens, sendo, portanto, adjetivo; na frase II, dois é determinado por par, sendo, portanto, substantivo. Logo, os numerais da NGB devem ser classificados como pertencentes à classe dos nomes, com função de substantivo ou adjetivo, e não como numerais.
 
e) Pronomes .
 
Para a NGB,
 
"Pronome é a palavra que substitui ou acompanha um substantivo (nome), em relação às pessoas do discurso (...) pronomes substantivos são aqueles que substituem o substantivo; pronomes adjetivos são aqueles que acompanham o substantivo."
(Sacconi, 1990, pág, 171)
 
Embora já tenhamos abordado o assunto pronome no item dedicado ao "artigo", cumpre-nos aqui observar um erro de nomenclatura, face à não separação dos gramáticos tradicionais entre classe e função, onde, como já assinalamos anteriormente, o pronome é uma classe, pelo seu caráter dêitico, que pode Ter a função de substantivo (isto é incrível) ou de adjetivo (este menino é incrível).
 
f) Verbo
 
Para a NGB,
"Verbo é a palavra que, por si só, indica um fato (em geral ação, estado ou fenômeno) e situa-o no tempo".
(Ferreira, 1992, pág )
Qualquer estudante reconhece um verbo na frase, mas a NGB insiste em conceituar "classes" de palavras por um critério semântico isolado, sem relação distintiva com outras palavras.
 
Podemos reconhecer o verbo por dois critérios fundamentais: o desinencial e a variação temporal. Monteiro (1991) apresentou-nos a forma "bacorejaríamos" como verbo e mostrou que qualquer pessoa que estiver estudando verbo o reconheceria pelas suas desinências -ria- (modo-temporal) e -mos (número-pessoal), ainda que não soubesse o seu significado. Outra forma possível é a variação temporal. Se observarmos a frase "eu fui à feira", poderíamos obter variações como "eu vou à feira", "eu iria à feira", "eu irei à feira", etc..
 
Realmente, o verbo é uma classe de palavras, mas não porque indique fenômeno, ação ou estado, mas pela oposição de seu quadro desinencial característico, que o difere, por exemplo, dos nomes.
 
g) Advérbio
Para os gramáticos tradicionalistas, o
"advérbio é a palavra invariável que modifica essencialmente o verbo, exprimindo uma circunstância".
(Sacconi, 1990, pág, 252)
 
Essa definição carece de propriedades, uma vez que o advérbio pode estar relacionado com o adjetivo ou com outro advérbio.
 
I- Eu estou muito feliz
 
II- Cheguei muito cedo
 
Percebe-se que, na frase I, o advérbio muito está relacionado ao adjetivo feliz, enquanto que na frase II, muito está relacionado ao advérbio cedo, que por sua vez está relacionado ao verbo cheguei.
 
Mas o grande problema de se classificar o advérbio como classe é não se entender a diferença entre classe e função. Como já vimos anteriormente, a classe gramatical é identificada por critérios mórfico e semântico, ou seja, seu quadro desinencial e seu valor semântico.
Se analisarmos a frase
Eu cheguei cedo
percebemos que o elemento cedo determina o verbo chegar, que determina o sujeito eu. Pode-se dizer que cedo situa eu cheguei no tempo, servindo como sinal, nada simbolizando, sendo, portanto, um pronome. Os símbolos (nomes) não podem ser retirados da frase ou substituídos, sob pena de não mais haver o significado, diferente dos sinais (pronomes), que são situacionais.
 
Quanto à função, essa é de natureza sintática. Vejamos, então, a frase:
 
Este menino é muito inteligente
 
observamos que menino é determinado por este e por inteligente, sendo menino um substantivo e este e menino, adjetivos. Entretanto, muito determina inteligente, que possui função adjetiva, sendo um elemento terciário, ou simplesmente advérbio. O advérbio é, portanto, um elemento terciário, que determina um termo determinante, como na frase:
 
O menino saiu de madrugada.
 
onde menino é determinado pelo adjetivo o e pelo verbo saiu. Já o verbo saiu é determinado pelo advérbio de madrugada, que o situa no tempo.
 
Daí conclui-se que o advérbio não é uma classe, mas uma função, pertencente à classe dos pronomes.
 
h) Preposição e Conjunção
 
Observemos duas definições dadas pelo gramático Savioli (1994), de acordo com a NGB:
"
I - Preposição é a classe de palavras que:
. Do ponto de vista sintático, liga palavras entre si.
. Do ponto de vista mórfico, é invariável.
II - Conjunção é a classe de palavras que:
. Do ponto de vista sintático, liga palavras entre si.
. do ponto de vista mórfico é invariável."
(Savioli, 1994, pág. 376 e 381)
Primeiro, o autor utilizou o termo palavras, quando deveria ter usado vocábulos. Segundo, percebemos que o gramático diferenciou os dois termos apenas porque um liga "palavras" e o outro liga orações. Certamente o gramático não levou em consideração a "preposição" na frase "perdeu o trem por estar atrasado", onde a suposta "preposição" une duas orações; também não levou em consideração a "conjunção" na frase "há mais coisas entre o céu e a terra do que vossa vã filosofia possa imaginar", onde a suposta conjunção liga vocábulos e não orações.
 
Colocamos preposição e conjunção no mesmo item por não considerarmos que exerçam função ou possuam classe gramatical. Na verdade, são conectivos que ligam vocábulos ou orações, dando relação subordinativa (o livro de Pedro/quero que venhas) ou coordenativa (eu e você/fui e voltei).
 
i) Interjeição.
 
Sobre a interjeição, já falamos no início deste estudo e não consideramos classe de palavras, mas frases de situação, como: viva! Valha-me Deus!
'''7. CONCLUSÃO DO TRABALHO'''
 
7. CONCLUSÃO DO TRABALHO
 
Como se percebeu, os nossos livros "didáticos" passam para o nosso aluno uma gramática geralmente desprovida de fatos científicos. As classes gramaticais estudadas atualmente não correspondem ao que realmente são e, pior ainda, não se estabelece uma diferença entre classe e função.
 
Por Classe gramatical devemos entender a sua função morfológica propriamente dita, sendo três: o nome, o verbo e o pronome, partindo de um critério morfo-semântico, pois o sentido é definido com o auxílio da forma.
 
Por função, entendemos as relações que se processam nos eixos sintagmático e paradigmático, dependendo da sua função dentro do contexto frasal, e podem ser: substantivo, adjetivo e advérbio.
 
Existem, ainda os conectivos, que apenas relacionam vocábulos ou frases, sem no entanto exercerem função ou possuírem classe, como também as interjeições, que são somente frases de situação, não constutuindo função ou classe.
 
Entendemos que os graduados em letras devam Ter essas teorias discutidas em sua plenitude crítica para que os mesmos possam representar uma esperança de, num futuro muito próximo, tenhamos professores com maior senso crítico em relação ao material didático utilizado e com maior compromisso com o conteúdo ministrado.
 
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