Civilização Tupi-Guarani/História: diferenças entre revisões

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Segundo a teoria mais aceita pelos estudiosos, os povos indígenas da América são procedentes de migrações de povos asiáticos, que alcançaram a América através do Alasca. De lá, eles provavelmente desceram ao longo do continente americano até atingir o extremo sul da América do Sul.
[[File:Map-of-human-migrations.jpg|thumb|Mapa mostrando as migrações humanas. À esquerda, a Ásia; ao centro, a América do Norte e, à direita, a América do Sul.]]
Um destes povos diferenciou-se dos demais e desenvolveu uma língua do grupo linguístico macrotupimacro-tupi, no sul da Amazônia. De lá, ele se expandiu no início da era cristã para o resto da América do Sul, dividindo-se em várias tribos: tupinambás, potiguares, tabajaras, temiminós, tupiniquins, caetés, carijós, guaranis etc.<ref>BUENO, E. ''Brasil: uma história''. Segunda edição revista. São Paulo: Ática, 2003. p.19</ref>
[[File:Homtupinamba.jpg|thumb|Pintura do neerlandês Albert Eckhout do século XVI retratando um índio tupi]]
[[File:India tupi.jpg|thumb|Uma índia tupi e seu filho retratados por Albert Eckhout]]
Os macrotupismacro-tupis começavam a desenvolver a agricultura, principalmente de mandioca, que era um dos alimentos básicos de sua dieta. A agricultura era praticada pelo sistema de queimada, que limpava e adubava com as cinzas o terreno para o plantio. A caça, a pesca e a coleta de frutas e raízes completavam sua dieta.
[[File:Balanghoy.jpg|thumb|Plantação de mandioca]]
Em suas migrações através da América do Sul, os macrotupismacro-tupis eram orientados por líderes religiosos, os pajés, que lhes prometiam um paraíso ao final da jornada: a chamada "terra sem males" (em guarani, ''yvy marae''<ref>http://www.tekoamboytyitarypu.site90.com/index.php?news&nid=9</ref>).
[[File:Xamã guarani.jpg|thumb|Pajé guarani]]
No século XVI, com a chegada dos colonizadores europeus, alguns povos macrotupismacro-tupis, como os temiminós e os tabajaras, se aliaram aos portugueses, enquanto outros, como os potiguares e os tamoios, se aliaram aos franceses. Os carijós e os guaranis se aliaram aos espanhóis. Porém o resultado era sempre o mesmo: destruição das aldeias indígenas, escravização, doenças trazidas pelos europeus, fuga das populações indígenas para o interior do continente e para os aldeamentos criados pelos padres jesuítas (as "reduções" ou "missões", onde os índios eram catequizados e perdiam muito de sua cultura indígena). Um importante fator que estimulou a escravização dos índios foi a falta de mulheres entre os europeus que chegavam à América. Com isto, o ataque a aldeias indígenas e o apresamento de índias tornou-se uma saída para a obtenção de mulheres. Os filhos dessas uniões, chamados de mamelucos, por sua vez, também tomavam parte nas expedições escravizadoras de índios em direção ao interior do continente, as chamadas "entradas e bandeiras"<ref>http://www.red.unb.br/index.php/emtempos/article/view/2668/2217</ref>.
[[File:Oscar Pereira da Silva - Desembarque de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro em 1500.jpg|thumb|Quadro de Oscar Pereira da Silva retratando o desembarque de Pedro Álvares Cabral em Porto Seguro em 1500. Os primeiros índios contatados pelos portugueses no Brasil foram os tupiniquins.]]
[[File:Tibiriçá.jpg|thumb|Tibiriçá, líder tupiniquim aliado dos portugueses na região da atual cidade brasileira de São Paulo, a qual teve origem num aldeamento jesuítico]]
Os índios macrotupis reagiram contra essa política de escravização ou fugindo para o interior do continente ou atacando as povoações portuguesas no Brasil. Uma importante rebelião macrotupimacro-tupi contra os portugueses foi a confederação dos Tamoios, que reuniu os tupinambás desde Cabo Frio, no atual estado brasileiro do Rio de Janeiro, até Bertioga, no atual estado brasileiro de São Paulo, de 1554 a 1567. Os tamoios (termo que vem do tupi ''tamuya'', "velho", significando que a revolta era incentivada pelos anciões das tribos) eram liderados por Cunhambebe e, posteriormente, por Aimberê<ref>http://www.staff.uni-mainz.de/lustig/guarani/lingua_tupi.htm</ref>. Reflexos dessa confederação puderam ser encontrados no episódio da França Antártica, quando a França tentou criar uma colônia na baía de Guanabara e aliou-se aos índios tamoios locais. A colônia francesa acabou por ser destruída pela aliança entre portugueses e índios tupiniquins e temiminós, episódio que culminou nas fundações das cidades do Rio de Janeiro (1565) e Niterói (1567). A confederação dos Tamoios só veio a ser destruída totalmente em 1567, na guerra de Cabo Frio, com o ataque português ao último reduto tamoio nessa localidade do litoral fluminense e com a morte do líder tamoio Aimberê.
[[File:Quoniambec.jpg|thumb|Cunhambebe, líder tamoio, retratado por André Thevet no século XVI]]
Muitos europeus dos séculos XVI e XVII que viveram durante algum tempo no continente americano descreveram os hábitos dos índios macrotupismacro-tupis em livros que se tornaram ''best sellers'' no continente europeu, como o alemão Hans Staden, os franceses Jean de Léry, André Thevet e Claude d'Abbeville, os portugueses Pero de Magalhães Gândavo e Gabriel Soares de Sousa e o florentino Américo Vespúcio.
[[File:Tearful salutations in Histoire d un voyage fait au Bresil 1580.jpg|thumb|Desenho do livro autobiográfico de Jean de Léry mostrando saudações lacrimosas entre europeu e índia tupi, um costume tupi]]
[[File:Hans Staden, Execução de um Prisioneiro que Está Preso à Mussurana.gif|thumb|Desenho do livro autobiográfico de Hans Staden retratando a execução de um prisioneiro dos índios tupinambás que está amarrado à corda ''muçurana''. À esquerda, um índio segura o porrete tupi ''ibirapema'' com o qual irá desferir o golpe fatal contra o prisioneiro.]]
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[[File:O Uraguai.jpg|thumb|Capa de edição de ''O uraguai'']]
[[File:Lacador.JPG|thumb|Estátua do Laçador em Porto Alegre, no Brasil, representando o típico gaúcho. A estátua foi inaugurada em 1958.]]
A literatura árcade brasileira do século XVIII ainda produziria um outro épico que retratava os costumes dos macrotupismacro-tupis: ''Caramuru'' (1781), de Santa Rita Durão. O livro retrata a saga de Diogo Álvares Correia, náufrago português na Bahia do século XVI que viveu entre os tupinambás do recôncavo Baiano, pelos quais foi apelidado de ''Caramuru'' (termo tupi que significa "que ronca, poderoso"<ref>''Supermanual do escoteiro-mirim''. São Paulo: Abril, 1979. p. 357</ref>), numa alusão à espingarda usada pelo náufrago português.
[[File:Anônimo - Episódios da vida de Diogo Álvares Correia, o Caramuru (II).JPG|thumb|Pintura no mosteiro de São Bento da Bahia retratando a chegada de Diogo Álvares Correia à Bahia no século XVI]]
No litoral brasileiro, o aumento da imigração portuguesa por causa da descoberta de ouro no Brasil no final do século XVII, a expulsão dos jesuítas (que mantinham escolas onde o tupi era o idioma usado no ensino) do Brasil e a proibição do uso do idioma tupi no Brasil pelo marquês de Pombal (ambos em 1759) determinaram a progressiva redução da influência do tupi na região até sua substituição total pelo português como língua franca ao longo do século XVIII. No entanto, sua influência permaneceu sob a forma de um expressivo vocabulário de topônimos (Piratininga, Itaipu, Ubatuba etc.) e de nomes de animais e vegetais (jacaré, jabuti, jabuticaba etc.), bem como na forma de uma língua portuguesa com pronúncia, tempos verbais e colocações pronominais diferentes dos de Portugal.
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[[File:Jabuticaba2.jpg|thumb|Jabuticaba (''Myrciaria'' sp.). "Jabuticaba" é uma palavra tupi que significa "comida de jabuti"<ref>http://dicionariorapido.com.br/jabuticaba/</ref>.]]
[[File:Ipanema.png|thumb|Praia de Ipanema, no Rio de Janeiro. "Ipanema" vem do tupi ''upá'-nem-a'', que significa "lagoa fedorenta". O nome é uma referência ao antigo proprietário da região: o barão de Ipanema<ref>http://www.fflch.usp.br/dlcv/tupi/os_pronomes_pessoais_continuacao.htm</ref>.]]
Em 1822, o Brasil se tornou independente de Portugal. Isso fez com que a nova nação se voltasse para a cultura indígena como símbolo de sua autonomia. Uma das consequências desse surto nacionalista foi a criação do gentílico "carioca" (termo tupi que significa "casa de cascudo", "casa de branco"<ref>http://blognorio.wordpress.com/2010/08/10/mais-curiosidades-sobre-a-baia-de-guanabara/</ref> ou "casa de carijó"<ref>http://www.fflch.usp.br/dlcv/tupi/tempo_nomina_em_tupi.htm</ref>) para os naturais da cidade do Rio de Janeiro, em 1834 e a alteração do nome da Vila Real da Praia Grande para Niterói (outro nome tupi, significando "água escondida") em 1835. Esse interesse pela cultura indígena como símbolo do jovem país também se refletiu na literatura romântica brasileira do século XIX. O poeta brasileiro Gonçalves Dias (1823-1864) escreveu vários poemas com temática tupi, como ''I-juca-pirama'' (1851) e ''Os timbiras'' (1857). Embora este último apresente um título equivocado, pois os timbiras pertencem, na verdade, ao grupo linguístico macrojêmacro-jê. Na obra, Gonçalves Dias descreve típicos costumes dos índios tupis, imputando-lhes erroneamente aos timbiras<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/povo/timbira</ref>. Em 1857, José de Alencar escreveu ''O guarani'', clássico da literatura brasileira que tem como protagonista o índio guarani Peri<ref>ALENCAR, J. ''O guarani''. Adaptação de André Carvalho. Belo Horizonte: Itatiaia, 1964. p.141</ref> (ainda que o autor, contraditoriamente, o qualifique como um índio goitacá, em outra passagem do livro<ref>ALENCAR, J. ''O guarani''. Adaptação de André Carvalho. Belo Horizonte: Itatiaia, 1964. p.142</ref>). Em 1865, Alencar escreveu ''Iracema'', na qual a protagonista era uma índia tabajara. Em 1874, lançou ''Ubirajara'', baseando-se em costumes tupis. O final do livro descreve uma batalha de duas tribos tupis contra uma tribo tapuia<ref>ALENCAR, J. ''Ubirajara''. São Paulo: Ática, 1996. pp. 61-70</ref>.
[[File:Pedro Américo - A carioca - 1882.jpg|thumb|''A carioca'', quadro de Pedro Américo de 1882]]
[[File:COA of Niterói.svg|thumb|Brasão de Niterói, com o ano da adoção do seu nome tupi: 1835]]
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Em 17 de julho de 1873, o ministério de agricultura, comércio e obras públicas do império brasileiro decretou o fim das aldeias indígenas no Brasil, sob o argumento de que não existiriam mais índios no país. Isso significou que as terras ocupadas pelos índios brasileiros passaram a ser consideradas legalmente sem dono e, portanto, passíveis de compra através de leilão público<ref>http://plantasenteogenas.org/community/threads/kariri-xoc%C3%B3-o-povo-da-sagrada-jurema.4376/</ref>.
 
A partir do final do século XIX, começou a ocorrer a migração de tribos guaranis do sul da América do Sul para o litoral brasileiro, num processo que continua até hoje<ref>http://www.ubatuba.com.br/indios.asp</ref><ref>http://www.tekoamboytyitarypu.site90.com/index.php?p=1_2_Aldeia</ref>. Isso resultou na legalização de alguns territórios indígenas guaraniguaranis no sudeste brasileiro, como a aldeia Krukutu e o território Tenondé Porá, na cidade de São Paulo<ref>http://www.culturaguarani.org.br/historia.htmlos</ref> e as aldeias de Sapukai, Parati-mirim, Araponga, Saco de Mamonguá e Rio Pequeno, no litoral oeste do estado do Rio de Janeiro<ref>http://www.aldeiaguaranisapukai.org.br/guarani/artigo_historia_guarani_brasil_domingos_nobre.pdf</ref>.
[[File:Guarani girl.jpg|thumb|Menina guarani da etnia mbyá. A etnia mbyá é a principal etnia guarani presente atualmente no litoral brasileiro.]]
Em 1910, foi criado o primeiro órgão do governo brasileiro voltado para a questão indígena: o Serviço de Proteção ao Índio.
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Na década de 1980, ocorreu o primeiro contato oficial dos índios zoés com o homem branco. Os índios zoés vivem no Estado brasileiro do Pará, no município de Óbidos. Foi, talvez, a última vez que um grupo macrotupi isolado entrou em contato com o homem branco. Istou gerou iniciativas do governo brasileiro no sentido de estudar a cultura zoé e, ao mesmo tempo, de protegê-la de influências culturais externas que corrompessem sua pureza e sua originalidade<ref>http://www.revistaforum.com.br/conteudo/detalhe_materia.php?codMateria=3189</ref>.
 
Em 1985, foi lançado o filme brasileiro ''Avaeté - semente da vingança'', que se baseava no episódio real do massacre dos índios cintas-largas no noroeste do estado brasileiro de Mato Grosso<ref>http://www.epipoca.com.br/filmes_detalhes.php?idf=6799</ref>. Para interpretar os papéis indígenas, o filme utilizou índios da etnia rikbaktsa, que não pertencem ao grupo linguístico macrotupimacro-tupi, mas sim ao grupo linguístico macrojêmacro-jê<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/povo/rikbaktsa/349</ref>.
 
Em 1986, estreou o filme inglês ''The mission'' ("A missão"), que retratava o episódio histórico das guerras guaraníticas. O filme ganhou a palma de ouro no festival de Cannnes e o oscar de fotografia<ref>http://www.historianet.com.br/conteudo/default.aspx?codigo=107</ref>.
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Em 2009, foi lançada a versão em língua guarani da Wikipédia<ref>http://tecnologia.terra.com.br/interna/0,,OI3485912-EI4802,00.html</ref>.
[[File:Wikipedia-logo-v2-gn.svg|thumb|Logotipo da ''Viquipetã'', a Wikipédia em língua guarani]]
Em 2010, o município de Tacaru, no extremo sul do estado brasileiro do Mato Grosso do Sul, oficializou o guarani como idioma oficial do município junto com o português<ref>http://www.tvcultura.com.br/auwe/player/content/27972</ref>. No mesmo ano, índios guaranis kaiowáscaiouás da aldeia Pirajuí invadiram a fazenda São Luís, em Paranhos, no oeste do estado brasileiro de Mato Grosso do Sul, reivindicando a terra que haveria pertencido a seus ancestrais. O ministério público e a polícia federal brasileiros interviram no caso, buscando uma conciliação entre as partes envolvidas<ref>http://video.globo.com/Videos/Player/Noticias/0,,GIM1324585-7823-INVASAO+DE+FAZENDA+EM+MATO+GROSSO+DO+SUL+ACIRRA+ANIMOS+ENTRE+INDIOS+E+AGRICULTORES,00.html</ref>.
[[File:Guarani Family.JPG|thumb|Família guarani em Mato Grosso do Sul]]
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