Civilização macrojê/História: diferenças entre revisões

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Segundo a tese tradicional, o grupo linguístico macro-jê surgiu no leste do Brasil. No entanto, devido a descobertas recentes que incluem os chiquitanos da Bolívia e Mato Grosso e os jabutis de Rondônia como pertencentes ao grupo macro-jê, surgiu recentemente uma tese que aponta o oeste brasileiro como centro de origem do grupo<ref>http://www.letras.ufg.br/macroje/?menu_id=3803&pos=esq</ref>.
 
Acredita-se que os povos macro-jês detinham a hegemonia sobre a maior parte do atual território brasileiro, até que, por volta do ano 1000, os povos do grupo linguístico macro-tupi, provenientes do sul da Amazônia, migraram para o leste, expulsando grande parte dos macro-jês que habitavam o litoral brasileiro e forçando-os a se alojarem no interior do Brasil, que possuía condições naturais menos propícias que o litoral. Na época da chegada dos colonizadores portugueses ao litoral brasileiro, ou seja, a partir do século XVI, as únicas exceções ao domínio tupi no litoral brasileiro eram os tremembés, nos atuais litorais do Maranhão, Piauí e Ceará; os aimorés, no sul da Baía e norte do Espírito Santo e os goitacazes, no norte do Rio de Janeiro e sul do Espírito Santo. Todos, pertencentes ao grupo linguístico macro-jê<ref>BUENO, E. ''Brasil: uma históriaHistória''. São Paulo: Ática, 2002. p.18</ref>. Na época da safra de caju, porém, os índios macro-jês do interior realizavam incursões ao litoral dominado pelos tupis para colher a fruta, ocasionando as chamadas ''guerras do caju''<ref>http://www.portalsaofrancisco.com.br/alfa/caju/caju-6.php</ref>.
[[File:Slide27.JPG|500px|thumb|Distribuição aproximada das nações indígenas no litoral brasileiro no século XVI]]
[[File:Terra dos Tremembé - 1629.PNG|300px|thumb|Mapa de 1629 mostrando o território dos índios tremembés no atual litoral do Ceará]]
[[File:Rugendas indiobotocudo.gif|thumb|Índio aimoré em gravura de Johann Moritz Rugendas do século XIX]]
[[File:Campos.jpg|thumb|Campos dos Goitacazes, cidade do estado brasileiro do Rio de Janeiro que se localiza no antigo território dos índios goitacazes]]
Desta forma, quando os portugueses chegaram ao litoral brasileiro, se depararam principalmente com tribos do grupo linguístico macro-tupi. Os colonizadores portugueses absorveram muito da cultura macro-tupi, inclusive a designação tupi para os povos do grupo macrojê: ''tapuia'', que significa ''"inimigo", "escravo''". Os macro-jês ofereceram grande resistência à colonização portuguesa do território brasileiro, sendo responsáveis pela morte de muitos colonos portugueses e pelo fracasso de muitas capitanias hereditárias, como a de Ilhéus, a de Porto Seguro, a do Espírito Santo e a de São Tomé<ref>BUENO, E. ''Brasil: uma históriaHistória''. São Paulo: Ática, 2002. pp. 43-44</ref>. No entanto, os índios não tardaram a sucumbir perante as forças militares europeias e as doenças trazidas pelos europeus, como a varíola e o sarampo, para o qual não apresentavam qualquer resistência natural. Os índios goitacazes, por exemplo, foram derrotados em 1631 e se dispersaram pelo interior dos atuais estados brasileiros de Rio de Janeiro, Espírito Santo e Minas Gerais, passando a ser conhecidos como puris, coroados e coropós.
[[File:Rugendas - Coroatos e Coropos.jpg|thumb|Pintura de Johann Moritz Rugendas no século XIX intitulada ''"Coroados e coropós''Coropós"]]
[[File:Puri-Indians-Brazil-dancing.jpg|thumb|Pintura de 1875 intitulada ''"Dança dos puris''Puris"]]
Assim como algumas tribos tupis se aliaram aos portugueses, alguma tribos jês se aliaram aos neerlandeses, quando estes invadiram o nordeste brasileiro no século XVII. Por exemplo, a nação tarairiu, que ocupava o interior dos atuais estados brasileiros da Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará<ref>http://www.auniao.pb.gov.br/v2/index.php?option=com_content&task=view&id=5295&Itemid=44</ref>.
[[File:Albert Eckhout 1610-1666 Tarairiu-dansere.jpg|thumb|Quadro de Albert Eckhout do século XVII intitulado ''"Dança tarairiu''Tarairiu"]]
O avanço dos colonizadores portugueses sobre territórios habitados pelos índios do grupo macrojêmacro-jê, visando à plantação de cana-de-açúcar, criação de gado e exploração de minas, causou reações violentas, como por exemplo a Confederação dos Cariris, que foi uma revolta generalizada das tribos de línguas macro-jês que habitavam o nordeste brasileiro contra os portugueses, no final do século XVII e início do século XVIII. Entre as tribos, estavam os paiacus, os caripus, os icós, os caratiús e os cariris. A revolta durou de 1688 a 1713 e terminou com a derrota e a quase extinção desses povos<ref>BUENO, E. ''Brasil - uma História''. Segunda edição. São Paulo: Ática, 2003. p. 66</ref>.
 
O avanço dos colonizadores, no entanto,europeus continuou ao longo dos séculos, diminuindo progressivamente a área dos índios de línguas macro-jês que, antes da chegada do homem branco, detinham o controle de praticamente todo o Brasil centralCentral. Muitas tribos foram forçadas a fugir para o oeste e outras foram dizimadas sem deixar qualquer registro escrito sobre suas culturas e línguas.
 
Ao longo do século XIX, as regiões montanhosas do sul do Brasil, que eram território tradicional dos índios caingangues, passaram a ser alvo da expansão da fronteira agrícola. Guerras realizadas pelos governos provinciais da região forçaram o aldeamento dos índios e permitiram a fixação de agricultores na região. Entre eles, imigrantes italianos, alemães, poloneses, ucranianos, russos etc. O mesmo processo ocorreu na província argentina de Misiones. No oeste do estado brasileiro de São Paulo, tal processo ocorreu no início do século XX, com a abertura da estrada de ferro que ligaria a cidade de Bauru ao estado de Mato Grosso. Devido aos frequentes ataques dos caingangues locais aos trabalhadores envolvidos na construção da estrada, foi criado o Serviço de Proteção ao Índio, em 1910, visando a cuidar da questão indígena no país<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/povo/kaingang/287</ref>. Seu primeiro diretor foi o marechal Rondon.
 
No século XIX, o cientista alemão Carl Friedrich Philipp von Martius percorreu grande parte do território brasileiro e propôs uma divisão dos índios brasileiros segundo um critério linguístico. Baseado nesse critério, ele criou o grupo gê, que englobava tribos que falavam línguas semelhantes e que costumavam autodenominar-se utilizando a partícula ''gê'', que significava ''"pai", "chefe" ou "antepassado'"'. Um nome alternativo, segundo o próprio Martius, seria ''cram'', pois, nesse grupo, também era muito utilizada a partícula ''cran'' (''"filho", "descendente''") para a nomeação das tribos. Grande parte das antigas tribos tapuias estava englobada pelo grupo gê<ref>CHAIM, M. ''Aldeamentos Indígenas (Goiás 1749-1811)''. Segunda edição. São Paulo: Nobel, 1983. p. 47</ref>.
[[File:Carl Friedrich Philipp von Martius.jpg|thumb|Retrato de Carl Friedrich Philipp von Martius]]
Com o advento do estilo romântico de literatura ao Brasil, no século XIX , o índio passou a ser um tema frequentemente utilizado pelos autores. No clássico romance de 1857 ''"O guarani''Guarani", de José de Alencar, o protagonista é um índio goitacá, Peri<ref>ALENCAR, J. ''O guaraniGuarani''. Adaptação de André Carvalho. Belo Horizonte: Itatiaia, 1964. p.142</ref>, que, em determinada ocasião, enfrenta uma tribo aimoré<ref>ALENCAR, J. ''O guaraniGuarani''. Adaptação de André Carvalho. Belo Horizonte: Itatiaia, 1964. p.139</ref>. Embora, contraditoriamente, o autor também coloque Peri como índio guarani (uma etnia não falante de língua do tronco macro-jê), em outro trecho do livro<ref>ALENCAR, J. ''O guaraniGuarani''. Adaptação de André Carvalho. Belo Horizonte: Itatiaia, 1964. p.141</ref>. No mesmo ano, o poeta brasileiro Gonçalves Dias lançou o poema épico ''"Os timbiras''Timbiras". Apesar de os timbiras serem uma etnia indígena pertencente ao grupo linguístico macro-jê, o autor utilizou-se de tradições tupis para descrever os timbiras, devido a sua pouca familiaridade com os reais costumes timbiras<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/povo/timbira</ref>. Em 1874, Alencar lançou o romance ''"Ubirajara''", que descreve uma grande batalha envolvendo duas tribos tupis contra uma tribo tapuia. O confronto reproduz a clássica rivalidade entre os índios do grupo linguístico macro-tupi e os do grupo macro-jê<ref>ALENCAR, J. ''Ubirajara''. São Paulo: Ática, 1996. pp. 61-70</ref>.
 
Ainda no século XIX, o povo aquém, que vivia na região do atual estado brasileiro de Tocantins, se dividiu em dois: uma parte ficou na região e passou a ser conhecido como povo xerente. A outra parte migrou para o oeste, para o atual estado brasileiro do Mato Grosso, passando a ser conhecido pela denominação de povo xavante<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/povo/xerente/1171</ref>.
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No final do século XIX e início do século XX, foi construída a Estrada de Ferro Vitória - Minas, desalojando os últimos índios aimorés que ainda habitavam a região. Os últimos remanescentes dos aimorés estão atualmente em reservas nos arredores do município de Resplendor, em Minas Gerais, sob a denominação de crenaque, que é o nome pelo qual eles mesmos se reconhecem.
[[File:Implantação de trecho da EFVM, Coronel Fabriciano MG.jpg|thumb|Implantação da estrada de ferro Vitória - Minas perto de Coronel Fabriciano, em Minas Gerais, no Brasil, em 1924]]
Dentro de um processo de reconhecimento científico e político do valor da cultura indígena, o governo brasileiro iniciou uma política de pesquisa da cultura indígena, pacificação de tribos indígenas hostis e criação de reservas indígenas onde os índios poderiam preservar sua cultura, como o Parque Indígena do Xingu, criado em 1961. Vários nomes se destacaram dentro desse processo, como os irmãos Villas-Bôas, o antropólogo DarcyDarci Ribeiro e o marechal Rondon: este, um descendente de várias etnias indígenas, como a dos bororos, por exemplo.
 
Outro intelectual que se destacou dentro desse processo de estudo da cultura indígena brasileira foi o antropólogo belga Claude Lévi-Strauss, que, durante a segunda metade da década de 1930, realizou várias expedições pelo interior do Brasil visando a estudar a cultura indígena. Entre as etnias por ele visitadas, estavam a dos caingangues e a dos bororos. Suas experiências ficaram registradas em seu famoso livro, "Tristes Trópicos", lançado em 1955.
[[File:Levi-strauss 260.jpg|thumb|Claude Lévi-Strauss]]
Em 1937, foi criada a Terra Indígena Caramuru-Paraguaçu, no sul do estado brasileiro da Baía, destinada a abrigar índios pataxós hã-hã-hães. Porém, logo em seguida, o governo brasileiro começou a conceder lotes dentro da terra indígena para agricultores, iniciando um conflito fundiário que perduraria por décadas.
 
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Em 1974, os índios xavantes e bororós ameaçaram invadir cidades do estado brasileiro do Mato Grosso em protesto contra a invasão de suas terras. Os índios alegavam possuir títulos de posse dos seus terrenos datados de 1918 enquanto que os invasores alegavam possuir títulos de posse dos mesmos terrenos dados pelo governo em 1958<ref>http://www.jblog.com.br/hojenahistoria.php?itemid=10959</ref>.
 
Para evitar a confusão com a letra ''"g''" do alfabeto, o termo ''"''" foi substituído por ''"''". Atualmente, considera-se ''"''" o nome de uma família linguística, a qual pertencem as línguas apinajé, aquém, caiapó, caingangue, timbira, panará, suiá e xoclengue. O termo ''macrojê''"macro-jê" designa o tronco linguístico que abrange, além da família jê, as famílias bororo, botocudo, camacã, carajá, cariri, guató, masacará, maxacali, maromomi, ofaié, puri, riquibatissa e tarairiu.
 
Em 1980, o xavante Mário Juruna representou os índios brasileiros no Quarto Tribunal Bertrand Russel, nos Países Baixos. Em 11 de agosto do mesmo ano, índios txucarramães (um ramo dos índios caiapós) liderados pelo cacique Raoni, mataram onze peões que estavam desmatando um terreno no parque do Xingu, próximo à aldeia Cretire<ref>http://jblog.com.br/hojenahistoria.php?itemid=22945</ref>. Em 1982, Juruna foi eleito, pelo estado brasileiro do Rio de Janeiro, o primeiro deputado federal brasileiro de origem indígena. Juruna foi responsável pela criação da comissão permanente do índio no congresso nacional. Juruna também ficou famoso por gravar as promessas dos políticos e, depois, usar as gravações para cobrar as promessas feitas. O gravador de Juruna encontra-se, atualmente, exposto no Museu do Índio de Campo Grande, no estado brasileiro de Mato Grosso do Sul<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/c/iniciativas-indigenas/organizacoes-indigenas/historia</ref>.
 
Em 1984, o líder caiapó Raoni Metuktire tornou-se famoso nacionalmente ao conseguir, do então ministro do interior Mário Andreazza, a demarcação das terras de seu povo no norte do estado de Mato Grosso, após os índios bloquearem por mais de um mês a estrada BR-080. Na ocasião, Raoni presenteou o ministro com uma borduna (porrete indígena) e puxou o lóbulo da orelha do ministro, dizendo: ''"Aceito ser seu amigo, mas você tem que ouvir o índio''"<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/c/iniciativas-indigenas/organizacoes-indigenas/historia</ref>. Raoni pertencia a um ramo político caiapó que se opunha à postura comercial e predatória do líder Tutu Pombo, parente de Raoni, procurando, ao invés disso, proteger o meio ambiente e o estilo de vida tradicional dos caiapós<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/noticias?id=99569</ref><ref>http://pib.socioambiental.org/pt/noticias?id=94803</ref>.
 
Durante os trabalhos da assembleia nacional constituinte, que viria a elaborar e promulgar a constituição brasileira de 1988, um gesto do líder indígena Aílton Krenak ficou marcado como um dos símbolos da constituinte. Foi quando Krenak, ao discursar no plenário, pintou a face com a tinta preta do jenipapo para protestar contra o retrocesso no reconhecimento dos direitos dos índios<ref>http://pib.socioambiental.org/pt/c/iniciativas-indigenas/organizacoes-indigenas/historia</ref>.
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Em 2010, a justiça federal reconheceu o direito de os índios xavantes reocuparem a sua terra ancestral no estado brasileiro de Mato Grosso, a Terra Indígena Maraiwatsede, que estava ocupada por agricultores<ref>http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=2399</ref>.
 
Em 2011, o líder caiapó Raoni recebeu o título de cidadão honorário da cidade de Paris, em reconhecimento por sua luta pela defesa da Floresta Amazônica<ref>http://www.jn.pt/PaginaInicial/Brasil/Interior.aspx?content_id=2024057</ref>.
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File:PIX.jpg|Localização do Parque Indígena do Xingu no interior do Brasil
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File:Brasilia Congresso Nacional 05 2007 221.jpg|Congresso Nacional brasileiro
File:Raoni 4.jpg|Raoni Metuktire em visita a Lille, na França, em 2000
File:Sting ThePolice 2007.jpg|O cantor Sting, em ''show'' do The Police em 2007
File:Caiapo.jpg|Índios caiapós
File:Pataxohahahae.JPG|Índios pataxós hã-hã-hães reinvidicam na câmara dos deputados, em 2008, a retomada de terras invadidas por fazendeiros