Otimização/Métodos duais
Lagrangiana
editarO conceito de lagrangiana está sempre relacionado ao seguinte problema:
- Definição
A função lagrangiana associada ao problema é
- definida por
- .
Em alguns livros é usada a seguinte notação:
- definida por
e
- definida por
Deste modo, a lagrangiana fica expressa por
que é uma representação bem mais compacta.
Condições de otimalidade
editarPara permitir a compreensão da importância da função lagrangiana em otimização, é preciso ter em mente os principais resultados que garantem a otimalidade de uma solução para o problema . Nas próximas seções será apresentado um breve resumo das condições de otimalidade, dividindo-as em dois casos:
- Caso particular: quando é convexo e fechado.
- Caso geral: quando é arbitrário.
Caso particular
editar- Proposição
Seja função de classe no conjunto . Se é um minimizador local de no conjunto convexo e fechado , então:
Demonstração |
---|
Seja uma solução de , e fixe um ponto arbitrário . Denote por a restrição da função sobre o segmento de reta que passa por e por , ou seja,
Note que . Como é um minimizador de em , tem-se:
Logo,
Mas pela regra da cadeia,
Como era arbitrário, o resultado está demonstrado. |
- Observação
A condição significa que os vetores e formam um ângulo reto ou agudo (menor ou igual a 90 graus), conforme indicado na figura a seguir:
No caso específico, com e , é a derivada direcional de na direção . Quando tal número é não negativo, intuitivamente a função cresce naquela direção.
Quando é um conjunto convexo e fechado, a existência de uma solução para o problema é garantida pela seguinte proposição:
- Proposição
Se , é convexa e
Demonstração |
---|
Pela convexidade de , tem-se que:
Logo, Portanto, , ou seja, é um minimizador de em . |
Até aqui, não é exigido que qualquer das funções ou sejam diferenciáveis. Isto será utilizado mais adiante, nos algoritmos.
A próxima proposição fornece uma caracterização dos minimizadores, em termos do conceito de projeção.
Lembre-se que a projeção de um ponto sobre o conjunto , denotada por , satisfaz . Na verdade, vale:
- Proposição
Seja um número real fixado.
- Se é um minimizador local de em , então
- Se é convexa e , então é um minimizador global de em .
Demonstração |
---|
(1)
Como é um minimizador local de em , então Observe que essa desigualdade equivale à ou ainda Tomando e , tem-se a equivalência com: que equivale a dizer que , ou seja: (2) Reciprocamente, supor que , conforme a argumentação anterior, equivale a dizer que Usando a hipótese de que é convexa, segue da proposição anterior que é um minimizador global de em . |
Caso geral
editarPara tratar este caso, é preciso utilizar o conceito de cone tangente. O conjunto contínua o mesmo, ou seja, , embora não seja mais suposto que ele é convexo. Mesmo assim, ainda será fechado, pois as funções e que o definem são contínuas.
- Teorema
- Se é um minimizador local de em , então .
- Se é convexo, é convexa e , então é minimizador global de em .
Este teorema pode ser demonstrado de forma análoga a que foi feita anteriormente.
Demonstração |
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Esta demonstração é deixada a cargo do leitor. Sinta-se livre para melhorar a qualidade deste texto, incluindo-a neste módulo. |
Seja definido como:
- .
Pela segunda propriedade do cone tangente, tem-se:
- . Logo,
Em outras palavras, se é dado um conjunto e depois se restringe tal conjunto para , através do acréscimo de restrições inativas em um ponto , os cones tangentes aos dois conjuntos (no ponto ) coincidem.
- Definição
Toda condição que implica que é chamada de condição de qualificação das restrições.
Observação: Também se pode dizer condições de regularidade das restrições (do inglês, Regularity conditions).
Exemplos de condições de qualificação das restrições
editar(1) Se e são funções afim-lineares, então para qualquer , tem-se . Prova-se isso trivialmente
Prova |
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Esta prova é deixada a cargo do leitor. Sinta-se livre para melhorar a qualidade deste texto, incluindo-a neste módulo. |
(2) Condições de Slater: Se as funções são convexas e as são afim lineares e, além disso, existe tal que para todo , , então para qualquer , tem-se .
Prova |
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Esta prova é deixada a cargo do leitor. Sinta-se livre para melhorar a qualidade deste texto, incluindo-a neste módulo. |
(3) Condições de Mangasarian-Fromowitz: Se é linearmente independente e existe tal que para tpdp e .
Prova |
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Esta prova é deixada a cargo do leitor. Sinta-se livre para melhorar a qualidade deste texto, incluindo-a neste módulo. |
- Teorema (Karush–Kuhn–Tucker)
Suponha que , e são funções de classe em uma vizinhança do ponto e que . Se é um minimizador local de em , então existem e tais que:
Note que aqui aparece a lagrangiana, pois a primeira condição é equivalente a:
O essencial para a existência de é que .
- Teorema
Suponha-se que , e são funções de classe em uma vizinhança de , que e são convexas e que são afim-lineares. são funções de classe . Se existem e tais que:
A partir deste teorema são construídos alguns algoritmos.
Este módulo tem a seguinte tarefa pendente: Confrontar as informações presentes nestes últimos teoremas com algum livro. Parece estar precisando de pequenas correções. |
Considere o seguinte problema:
Sabe-se que dada por
- .
Agora, tem-se as KKT:
- Teorema
Supondo que e são de classe em uma vizinhança de e que , se é um minimizador local de em , então tal que de modo que:
Uma inequação sobre ínfimos e supremos
editar- Teorema
Sejam e dois subconjuntos arbitrários e considere uma aplicação . Então
Demonstração |
---|
Sabe-se que
quaisquer que sejam . Então, calculando o ínfimo em ambos os membros (com relação aos valores de ), e considerando que pode ser ilimitado inferiormente, tem-se para qualquer : Assim, calculando o supremo (com relação aos valores de ), segue das desigualdades anteriores: |
- Exercício
Verifique que:
Demonstração |
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Esta demonstração é deixada a cargo do leitor. Sinta-se livre para melhorar a qualidade deste texto, incluindo-a neste módulo. |
Defina-se a função:
- , dada por
e também
- , dada por
Conforme o exercício anterior, tem-se então
Observando a relação entre essas funções, é natural considerar dois problemas de otimização:
e
- Comentários
- As funções e são conhecidas na literatura como funções em dualidade (ou mais frequentemente, funções duais);
- O problema é conhecido como problema primal, enquanto é chamado de problema dual;
- Fazendo e , segue-se do exercício anterior que ;
- A diferença é chamada de brecha de dualidade, ou salto de dualidade (do inglês, skip duality);
- Exercício
Verifique que:
Resolução |
---|
Se tem-se que e .
Substituindo na lagrangeana tem-se que e tomando , se vê que o supremo dos valores é atingido, tendo como valor. Por outro lado, se existe um índice tal que e/ou . No primeiro caso, seja e
Com esta escolha, a lagrangiana será
Tomando o limite quando tem-se que . Para o outro caso a prova é análoga. |
- Exercício
Verifique que consiste de maximizar uma função côncava em um poliedro. Lembre-se:
- Uma função é côncava quando for convexa.
- Um poliedro é qualquer intersecção finita de semiespaços fechados.
Resolução |
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Primeiro será mostrado que : , dada por é uma função côncava. Para isso, basta mostrar que para cada vale
Chamando e tem-se: Quanto ao conjunto ser um poliedro, isso segue do fato de e serem interseções finitas de semiespaços fechados. |
Exemplo numérico: problema primal e seu dual
editarConsidere o problema
Resolução |
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O problema é ilustrado na imagem a direita. Primeiramente, é preciso identificar quais são as funções e envolvidas:
Neste caso, a lagrangiana é:
Em seguida, é preciso calcular e :
E, conforme um dos exercícios anteriores (ou através de uma breve análise dos supremos envolvidos na expressão anterior), tem-se: Analogamente, tem-se:
Observe que em relação a , tem-se uma função fortemente convexa, que portanto possui um único minimizador. Além disso, é diferenciável, donde o seu único minimizador é dado pela equação: ou seja, donde Portanto, Assim, os problemas em dualidade são: e Pelo primeiro item do exercício, tem-se que a minimização do problema é equivalente à minimização do problema original. Por outro lado, através da lagrangiana, obtem-se além do problema primal , um problema dual , cuja estrutura é muito melhor que a do original (pois pelo outro exercício, consiste da maximização de uma função côncava em um poliedro), e que servirá para encontrar o mínimo do problema primal (e consequentemente, do original). |
Ponto de sela
editarEste é um conceito muito importante relacionado à lagrangiana.
- Definição
Dado o problema e a lagrangiana associada a esse problema, se diz que é um ponto de sela de se e:
- .
- Teorema
O ponto é um ponto de sela de se, e somente se:
- é solução de ;
- é solução de ;
- .
Demonstração |
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Se é um ponto de sela de , então e se tem:
Em particular, como
segue da segunda desigualdade que e calculando o ínfimo sobre todos os tem-se: Por outro lado, da inequação sobre ínfimos e supremos, tem-se , então . Logo, todos os membros das desigualdades acima coincidem, ou seja, Mas da definição de tem-se:
Portanto, é solução do problema enquanto significa que é solução de
Reciprocamente, supondo que é solução do problema , tem-se: e admitindo que é solução do problema , segue: Além disso, usando como hipótese que , segue da definição que:
Em particular, tomando , e , resulta:
Logo, pela definição de tem-se:
Portanto, é um ponto de sela da lagrangiana .
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Exemplos
editarConsidere novamente o problema de otimização dado por:
Verificar se a lagrangiana associada à tem ponto de sela.
Resolução |
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O problema é ilustrado na imagem a direita, e conforme foi deduzido anteriormente, tem-se: Além disso, como foi mostrado anteriormente, vale e também ou seja, Agora, consideram-se os seguintes problemas em dualidade: e Donde é solução do problema primal, e . Intuitivamente, nos pontos em que assumir seu valor máximo, deve-se ter , pois conforme aumenta, decresce. Mas pela desigualdade a respeito de supremos e ínfimos, tem-se , quaisquer que sejam , . Como , e ao tomar e tem-se , segue-se que é uma solução do problema dual . Finalmente, como , e , segue que . Portanto, pelo teorema anterior, o ponto é ponto de sela da lagrangiana .
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Análise do problema
editarConsiderando , , e , se é uma solução do problema dual, considere o seguinte problema:
que no caso do exemplo reduz-se a
A solução deste problema é obtida resolvendo , sendo portanto . Note que esta é a solução do problema primal (e consequentemente do problema original ).
Será apenas uma coincidência? Ou ainda, em que situações a solução deste último problema será também solução do problema original?
A resposta será dada pelo próximo teorema. Acompanhe.
- Teorema (dualidade lagrangiana convexa)
Suponha-se que são de classe e convexas, e que as funções são afim lineares e . Nestas condições:
- Se o problema tem solução, então e os problemas e têm solução.
- Se tem solução, e é solução de , então as soluções de são as soluções de , onde
Antes da demonstração, vale a pena imaginar a seguinte aplicação da segunda parte do teorema: Se por alguma razão não se sabe resolver o problema original , pode-se optar por resolver (um problema concavo em um poliedro), e depois resolver (que é um problema convexo sem restrições). Em outras palavras, é possível trocar um problema difícil por dois problemas mais fáceis, e .
Agora a demonstração do teorema:
Demonstração |
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(1) Como tem solução, seja uma solução de . Pelo teorema de KKT (que se aplica pois as funções são de classe e se tem a qualificação das restrições), segue a existência de e , tais que:
Como são funções convexas e afim lineares, então a função lagrangiana é convexa em (pela forma de ). Isto significa que:
Usando (1), conclúi-se uma das duas desigualdades que definem um ponto de sela em :
Considerando que é solução de , tal ponto satisfaz as restrições e . Então, usando , segue que: pois e . Mas, por KKT, . Além disso, . Logo: Assim, quaisquer que sejam , e . Mas isso implica, por definição, que é um ponto de sela de . Logo, , é solução do problema primal e é solução do problema dual (2)Seja solução de (que existe, pelo item 1). Sabe-se pelo item anterior que o problema primal tem solução e que . Seja solução de . Então, é ponto de sela de , logo valem as desigualdades:
Uma vez que está fixo e a segunda desigualdade vale para qualquer , conclui-se que é solução do problema As soluções deste problema são soluções de e, consequentemente, do problema original. |
- Exercício
Verificar se existe salto de dualidade nos problemas em dualidade para o seguinte problema de minimização:
- Exercício
Juntamente com o problema do exercício anterior, considere o seguinte problema:
- Exercício
Experimente escolher e uma transformação linear, e um poliedro (intersecção finita de semi-espaços). É difícil de resolver o problema primal. Tente resolver o dual, usando os métodos conhecidos.
A seguir será apresentada uma proposição que responde a uma pergunta deixada anteriormente:
- Proposição
Considere o problema a lagrangiana e os problemas em dualidade e e soluções de . Se é solução do problema
Tal proposição fornece um roteiro para quem precisa resolver o problema relativamente difícil:
- Primeiramente, resolve-se ;
- Depois, constrói-se o problema e encontra-se uma solução para o mesmo;
- Finalmente, se satisfaz as últimas condições da proposição, ele é também uma solução de .
Demonstração |
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Se é uma solução de , . Então, pela definição de , tem-se:
Como é solução de , então: ou seja, Portanto, Por outro lado, como , tem-se e . Por hipótese, , então Logo,
Então para tem-se que e . Consequentemente, quaisquer que sejam , ou seja,
quaisquer que sejam . Portanto, é ponto de sela de , e assim, é solução primal (solução de ), e em consequência, solução de .
|
Resumo do esquema de dualidade
editarNeste ponto, pode-se sintetizar a estratégia geral para a resolução de problemas de otimização utilizando esquemas de dualidade.
Considere o problema
onde são funções de classe , e seja a lagrangiana definido por
- .
Convenciona-se que:
- é a variável primal;
- é a variável dual;
Nesse sentido, "o é o dual de " (não confundir com o significado que essa expressão teria na análise funcional. Ver nota sobre a terminologia), ou seja:
- é onde "mora" a variável primal ;
- é onde "mora" a variável dual ;
Definem-se então as funções e da seguinte maneira:
- , dada por
e
- , dada por
A partir destas duas funções, formulam-se os seguintes problemas duais:
e
É possível verificar que equivale ao problema original e que consiste da maximização de uma função côncava em um poliedro (convexo).
Logo, o dual de é .
Conclusões
editarDado qualquer problema , seu dual é um problema côncavo (isto é, a função objetivo é côncava), tal que os pontos satisfazendo o conjunto de restrições formam um poliedro convexo.
Apesar da controvérsia filosófica existente acerca do nome destes conceitos (coisa que poderia muito bem vir a ser alterada no futuro), a moral da história é que "transforma-se um problema geralmente difícil (sem estrutura) em um problema mais fácil (cheio de estrutura)".
Uma nota sobre a terminologia
editarNa subárea da matemática denominada Análise Funcional, quando se tem um espaço topológico , costuma-se chamar de dual topológico ao conjunto .
Aparentemente, os conceitos de dual da otimização e da análise funcional não tem relação um com o outro.
Um dos primeiros a falar de dualidade (espaços duais) foi o francês Fenchel, mas foi fortemente criticado por Urruty e Lemaréchal, pois os dois conceitos de dualidade não estão relacionados. Também o francês Brezis concordou que há um problema a ser resolvido com a nomenclatura, e um dos conceitos deveria deixar de ser chamado assim.