Retórica e argumentação/Método Socrático
Sócrates foi um filósofo ateniense que viveu por volta dos anos 469 AEC – 399 AEC. Ele não deixou nenhuma obra escrita e tudo o que sabemos sobre sua filosofia e sua vida provém de trabalhos do outros pensadores, principalmente seu discípulo Platão (c. 428 AEC – Atenas 348 AEC).
Platão descreveu Sócrates como o homem mais sábio de Atenas justamente por ter consciência da própria ignorância, enquanto seus conterrâneos eram arrogantes que presumiam saber muito mais do que realmente sabiam. Esta sabedoria socrática é fundamental à filosofia e até mesmo à ciência, uma vez que só podemos aprender, pesquisar e investigar, se admitirmos a nós mesmos que não temos a resposta para tudo.
Assim, de acordo com Platão, Sócrates andava por Atenas e iniciava conversas com outras pessoas, questionando todas suas alegações sem embasamento até que estas admitissem a ignorância no assunto que supunham ter conhecimento. Esta atitude inquisitiva ficou conhecida como método socrático e pode ser aplicada tanto aos outros, quando debatemos, ou a nós mesmos, quando refletimos sobre nosso posicionamento intelectual.
Ao questionarmos nossa própria posição, ou seremos capazes de responder as questões, o que fortalece nosso posicionamento, ou seremos incapazes, o que nos permite rever ou descartar crenças sem embasamento. De qualquer forma, saímos ganhando. Já quando questionamos os outros, ou eles serão capazes de responder as questões, o que nos permite aprender, ou serão incapazes, revelando a falta de embasamento de suas posições. Mais uma vez, saímos ganhando de qualquer forma, excepto pelo fato de que as pessoas tendem a ficar irritadas ao serem questionadas. O próprio Sócrates teria irritado tanto seus conterrâneos que ele foi condenado à morte por envenenamento, sob as acusações de corromper a juventude e negar a religião ateniense.
Quais questionamentos são pertinentes dependerá da posição ou alegação questionada, mas há três questões que frequentemente são úteis:
- (1) "Como você define o conceito que está utilizando?" Em várias obras de Platão, os interlocutores de Sócrates arrogantemente alegam dominar um assunto, mas sequer são capazes de definir o conceito debatido. Sócrates teria questionado Hípias sobre o que é a beleza, e Mênon sobre o que é a virtude; mas nenhum dos dois foram capazes de dar uma definição apropriada, apenas citar exemplos de coisas belas e ações virtuosas; ainda que pretendessem saber muito sobre o assunto. Em A República, Sócrates questiona seus interlocutores sobre o que é a justiça; em O Banquete, sobre o que é o amor; e em Eutifron, o que é a piedade. Nenhum dos seus interlocutores foram capazes de prover uma definição adequada a estes conceitos, ainda que falassem cheios de pompa sobre o assunto. Ora, sem uma definição precisa e correta, como podemos saber se estamos aplicando um conceito corretamente ou mesmo se nosso interlocutor entende nossa posição? Digamos que duas pessoas debatam se uma certa ação é justa ou não; sem uma definição de "justiça" que ambos aceitem, há o risco de que cada um tenha um entendimento completamente diferente do outro da questão, tornando o debate improdutivo.
- (2) "Como você sabe disto?" É comum as pessoas fazerem alegações de forma categórica, mas, quando questionadas sobre como elas sabem o que estão alegando, acabarem revelando (ainda que inintencionalmente) que o aquilo que alegaram não passava de dogmatismo, opinião, palpite ou algo que não foi concluído segundo uma metodologia adequada.
- (3) "Como implementar/aplicar suas ideias?"/"Como evitar que a implementação de suas ideias acarrete em tais e tais problemas?". É um questionamento muito útil, uma vez que muita gente adere a ideais políticos, teorias econômicas e princípios morais sem terem a menor ideia de como implementá-los ou como lidar com as consequências. Desta forma, quando o oponente de uma tese faz esta pergunta ao proponente, este se vê forçado a lidar com problemas concretos. Ao ser incapaz de resolvê-los, é como se o proponente ouvisse um "não!" da própria realidade, ao invés de meramente do oponente. Inclusive há um estudo de Harvard demonstrando que este tipo de questionamento é mais eficiente em fazer radicais políticos a reverem suas opiniões.