Análise real/Topologia da reta


Conceitos da topologia da reta que serão usados na Análise Real. Nota: para usar uma analogia com a geometria, um número real x também será chamado de um ponto x.

Conjunto aberto editar

Vizinhança editar

  • Seja X um conjunto real, a vizinhança de um elemento x de X são todos os elementos y que estão próximo de x a um "raio"  , isto é,   deve ser menor estrito a  . Portanto  
  •  
  • Tome  

Teorema da Vizinhança Interna editar

Tome  

Prova editar

Tome  , como  

Ponto interior editar

Um ponto x é dito ponto interior de um conjunto   se, e somente, se  

Usamos a notação   para denotar o conjunto de todos os pontos interiores do conjunto  

  •   ( A recíproca é falsa, por exemplo   )
  •  .
  •  .

Exemplos editar

  • Todo ponto x é um ponto interior de  
  • Todo número real x com a < x < b é um ponto interior do intervalo aberto (a, b). É fácil ver que nenhum outro ponto é ponto interior de (a, b); por exemplo, a não é ponto interior de (a, b) porque qualquer intervalo aberto em volta de a incluirá pontos menores que a.
  • Analogamente, os pontos interiores do intervalo fechado [a, b] formam o intervalo aberto (a, b).
  • Nenhum ponto é ponto interior de     ou  

Fronteira de um conjunto editar

Dado  . Um ponto   é dito ponto da fronteira de  , se toda vizinhança de x intersecta  .

  •  
  • Denotamos o conjunto dos pontos da fronteira do conjunto   por  .

Definição de conjunto aberto editar

  • Dizemos que um conjunto   é conjunto aberto se todos seus pontos forem pontos interiores, ou seja:  
    •   é aberto.
  • Dizemos que um conjunto   não é conjunto aberto se  
  • Um conjunto é aberto se  .

Exemplos editar

  • O intervalo aberto   com   é aberto, de fato, dado   tomando   temos que   Portanto, o intervalo aberto é, de fato, aberto.
  •   com   não é aberto, pois, qualquer que seja  
  •   é aberto, de fato, dado   tomando   temos que  
  •   é aberto, de fato, dado   tomando   temos que  

Propriedades dos conjuntos abertos editar

  1. Os conjuntos   e   são abertos.
  2. A união de uma família arbitrária de conjuntos abertos é um conjunto aberto.
  3. A intersecção de uma família finita de conjuntos abertos é um conjunto aberto.
Demonstração

1. Imediato da definição.

2.Seja   uma família de conjuntos abertos indexada pelo índice   e seja:

 

Então se   existe um   tal que  

Como   é aberto, existe um intervalo   com   tal que:

 

Como   temos que:

 

E portanto   é aberto.

3.Seja   uma família finita de conjuntos aberto e seja   e   Como   e cada   é aberto. Existem intervalos   tais que:

 

Naturalmente vale que   Agora definimos:

 

É fácil ver que   e também que:

 

e portanto:

 

O que completa a demonstração.

Lema editar

Seja  . As afirmativas abaixo são equivalentes.

  • (1) X é aberto.
  • (2) Todo ponto de X é ponto interior.
  • (3) X é uma vizinhança de seus pontos.

DEMONSTRACÃO editar

Vamos mostrar que  

  • Assumindo (1), Seja  . Como por hipótese, X é aberto, temos que  . Logo x é ponto interior de X. Como x é arbitrário, obtemos (2).
  • Seja agora (2) verdadeiro. Se  , então por hipótese, x é ponto interior de X, i.e.,   existe um aberto em X contendo x. Logo, por definição, X é uma vizinhança de x e (3) vale.
  • Finalmente, assumindo (3), tome para cada   um aberto   tal que  .

Então   é aberto pois é união de abertos.

Conjunto fechado editar

Ponto aderente editar

Ponto aderente de um conjunto é definido como todo ponto a que é limite de uma sequência de pontos xn ∈ X ⊂  

  • Todo ponto a de um conjunto   é também um ponto aderente, pois ele é o limite da sequência constante  
  • Um ponto aderente pode não pertencer ao conjunto, por exemplo, o conjunto   possui 0 como ponto aderente, mas 0 não pertence a X.

Valor de aderência editar

valor de aderência de uma sequência é um ponto aderente do conjunto  

  • O único valor de aderência de   é a.

Teorema editar

As seguintes afirmações são equivalentes:

  1.   é ponto aderente de  
  2. Para todo   existe um ponto   tal que  
  3.   para todo   Demonstração

12: Se a é um ponto aderente de X, por definição, existe um sequência   tal que   Da definição de limite de sequências, para todo   existe um   tal que   Como   basta definir   e o resultado segue.

23:Suponha que   e   Como     e o resultado segue.

31:Defina a sequência   escolhendo-os de forma que   Esta sequência tem a propriedade que   e   logo   e o resultado segue.

Fecho editar

Define-se o fecho de um conjunto X como o conjunto dos pontos aderentes de X e denota-se por  

 

Exemplos editar

  • Os fechos de   e   são eles mesmos
  • O fecho do conjunto {1, 1/2, 1/3, ...} é o conjunto {0, 1, 1/2, 1/3, ...}
  • Como cada número irracional pode ser arredondado com a precisão que se queira por números racionais, existe, para todo   uma sequência de números racionais   que converge para x. Ou seja, o fecho de   é  
  • Uma sequência de números naturais (ou inteiros) só será convergente se ela for constante a partir de algum índice. Portanto, uma sequência de números naturais (ou inteiros), se converge, converge para um número natural (resp. inteiro). Ou seja, os fechos de   e   são eles mesmos.
  • O fecho de qualquer intervalo (a, b), (a, b], [a, b) ou [a, b], em que a < b, é o intervalo fechado [a, b]. É fácil ver que nenhum ponto x < a e nenhum ponto x > b pode ser ponto aderente; então basta provar que a é um ponto aderente de (a, b) (os demais casos são similares). Mas isto equivale a dizer que existe uma sequência com elementos em (a, b) que converge para a. Tomando-se a sequência a + 1, a + 1/2, a + 1/3, ..., é fácil ver que esta sequência converge para a. Então, por definição, para ε = b - a > 0, existe N tal que se n > N, então |a - (a + 1/n)| < ε. Reescrevendo, temos que para n > N, 1/n < b - a, ou seja, a + 1/n < b. Como a + 1/n > a, temos que   Portanto, a sequência de elementos do intervalo (a, b) dada por a + 1/N, a + 1/(N + 1), a + 1/(N + 2), ... é uma sequência de elementos de (a, b) que converge para a.

Definição de conjunto fechado editar

Um conjunto   é dito conjunto fechado se e somente ele é igual ao seu fecho:  

Exemplos editar

  • São fechados:        .
  • Não são fechados:   .


Teorema editar

Um conjunto é fechado se, e somente se, seu complementar for um conjunto aberto. De fato, este é talvez o principal teorema sobre conjuntos fechados. Nos estudos mais avançados da chamada "topologia geral", os fechados são usualmente definidos através desta caracterização.

a. Suponha que X seja um conjunto fechado e O seja o complementar de X nos reais:

 

Suponha por absurdo que   não seja um conjunto aberto, ou seja, suponha a existência de um ponto   tal que:

 

Como   temos que

 

Esta propriedade implica que   e como X é fechado,  o que contraria a hipótese inicial de que   e  

b. Suponha que X seja o complementar nos reais de um conjunto aberto O:

 

Suponha a existência de uma sequência   tal que:

 

Queremos mostrar que   Suponha, por absurdo, que   ou seja,   Como O é aberto, exite uma bola   Escolha   tal que   Isso implica   o que é uma contradição, já que  

Propriedades dos conjuntos fechados editar

  1. Os conjuntos   e   são fechados.
  2. A intersecção de uma família arbitrária de conjuntos fechados é um conjunto fechado.
  3. A união de uma família finita de conjuntos fechados é um conjunto fechado.
Demonstração

1.   é aberto. Pelo teorema "Um conjunto é fechado   se, e somente se, seu complementar é aberto" o seu complementar é fechado, isto é,   é fechado.

Densidade editar

 .   é denso em   logo:

  • Dado  
  • Dado  
  • Dado  
  • Dado  

Ponto de acumulação editar

Ponto de acumulação editar

Seja X um subconjunto dos números reais. Dizemos que um ponto x pertencente aos reais é um ponto de acumulação se existe uma sequência   de pontos diferentes de x convergindo para x.

É claro da definição que todo ponto de acumulação é também um ponto de aderência. Deve-se observar que nem todo ponto de aderência é um ponto de acumulação. Por exemplo o conjunto   possui um único elemento. Este elemento é um ponto de aderência, já que a sequência constante   converge para ele, mas não é um ponto de acumulação, pois não existe nenhuma sequência de elementos de X diferentes de 0 convergindo para 0.

  • x é ponto de acumulação se,  
  • x é ponto de acumulação se,  

Conjunto Derivado editar

X' é o conjunto chamado derivado, onde seus elementos são os pontos de acumulação de X, assim:

 

Ponto isolado editar

Define-se como ponto isolado de um conjunto X, um elemento   que não é ponto de acumulação.

Conjunto discreto editar

Diz-se que   é um conjunto discreto se todos os seus pontos forem isolados. O conjunto dos números naturais é um exemplo de conjunto discreto nos reais.

Teorema: Conjunto discreto é enumerável editar

Seja   um conjunto cujos pontos são todos isolados, então  .

Demonstração editar

Uma vez que os pontos de   são todos isolados, para cada   podemos fixar   tal que  . Agora   é denso em  , então  .

Fixemos para cada   algum   e definamos a função   por  . Essa função é injetora, de fato, suponha que   devemos ter que   e  . Defina  , segue que  , mas isso significa que ou   ou   e em ambos os casos concluímos que  .

Uma vez que   é injetora devemos ter   e portanto   é enumerável.

Note que a mesma demonstração continua válida para espaços métricos que satisfazem o 3º axioma de enumerabilidade.

Teorema de Bolzano-Weierstrass editar

Seja   um conjunto infinito e limitado, então   possui pelo menos um ponto de acumulação.

Demonstração editar

Como X é um conjunto limitado, existe um intervalo finito   tal que   Defina   o ponto médio deste intervalo:

 

como   e X é um conjunto com infinitos pontos, podemos inferir que   ou   possui infinitos pontos. Definimos então:

:  

E define-se     é novamente um conjunto infinito. Este processo pode ser aplicado recursivamente, definindo:

   

e, finalmente,   que será um conjunto de infinitos pontos. Observe que a sequência   é não decrescente e limitada superiormente por b e a sequência   é não crescente e limitada inferiormente por a. Daí, podemos inferir a existência dos limites:

  e  

Como   estes limites deve ser idênticos:

 

Vamos mostrar agora que   é um ponto de acumulação de X. Para isso, devemos mostrar que para todo   o conjunto   possui infinitos pontos. De fato, fixe   e escolha n tal que:

 

Como   temos que   Logo   Como   é infinito por construção,   é um ponto de acumulação de X, o que completa a demonstração.

Aplicação editar

Uma aplicação versão ligeiramente modificada e muito útil do teorema de Bolzano-Weierstrass é a seguinte:

Todo sequência limitada de números reais admite uma sub-sequência convergente.

Teorema (Propriedade dos intervalos encaixantes) editar

Se   é uma sequência de conjuntos fechados, limitados e não-vazios tais que   então a intersecção destes conjuntos é não vazia. Isto é:

  Demonstração

Como cada   é não vazio é possível construir a sequência   tal que:

 

Do fato de os conjuntos   são limitados, passando a uma subsequência se necessário, pode-se supor   é uma sequência convergente para algum real  

De   se   temos que   e como cada um destes conjuntos é fechados,   para todo k. Daí temos que o limite   e o resultado segue.

Distância de um conjunto a um ponto editar

A distância de um conjunto até um ponto é um importante conceito na análise e permite uma nova caracterização para os pontos do fecho de um conjunto: um ponto   pertence ao fecho   de um conjunto   se e somente se a distância se   ate   é nula.

Definimos a distância entre um conjunto   e um ponto   como o ínfimo da distância entre os pontos de S e o ponto x.

 

Propriedades editar

  1.  
  2.  
  3.   Demonstração

1. Se   todo ponto   tem a propriedade que:

 

e o resultado segue.

2. Do fato que   e da definição de ínfimo, temos:

 

Para provar a desiguldade inversa, fixe um ponto   e defina

 

Da definição de ínfimo, podemos construir a sequência   tal que

 

Como   da definição de fecho de um conjunto, temos a existência de pontos   tais que:

 

Da desigualdade triangular, temos:

 

Agora, basta estimar:

 

E o resultado segue.

3. Resta-nos demonstrar que se   é um conjunto fechado então   Da definição de ínfimo, podemos construir a sequência   tal que

 

Da definição de limite, temos que:

 

Como   é um conjunto fechado, o limite   da sequência   deve pertencer a   Assim, o resultado segue.

Conjuntos compactos editar

Um conjunto é dito compacto se toda sequência contida em X possui uma sub-sequência que converge para algum ponto de X.

Todo compacto é fechado e limitado editar

a.Suponha que X não seja um conjunto fechado, então, por definição, existe uma sequência   que converge para um número real  . Como   é convergente, todas as suas sub-sequências convergem para o mesmo limite x, portanto, nenhuma subsequência de   converge para um ponto de X, logo X não pode ser compacto.

b.Suponha que X não seja um conjunto limitado. Então por definição, é possível construir uma sequência   tal que   Esta sequência não possui nenhuma sub-sequência convergente, logo X não pode ser compacto.

Todo conjunto fechado e limitado é compacto editar

Suponha que X é fechado e limitado e seja   uma sequência contida em X. A sequência   é limitado, portanto, possui um sub-sequência convergente para um limite   como X é fechado,   o que completa a demonstração.

Compacidade no sentido de Heine-Borel editar

Seja   um conjunto na reta e   um coleção de conjuntos abertos   indexados por um índice   Dizemos que   é uma cobertura de   se:

 

Exemplos de cobertura editar

  • A família de abertos   dada por   é uma cobertura para o conjuntos dos número reais,  
  • A família de abertos   dada por   é uma cobertura do intervalo  
  • A família de abertos   dada por   onde o índice   pertence a   é uma cobertura do intervalo  

Subcobertura editar

Seja   uma cobertura de   e   Dizemos que   é uma subcobertura de   se   é também uma cobertura de X.

Teorema de Heine-Borel editar

Um conjunto é compacto se e somente se possui a propriedade de Heine-Borel:

Toda cobertura de abertos admite uma subcobertura finita.
Demonstração

Começamos demonstrando o seguinte lema:

Lema

Se um conjunto K possui a propriedade de Heine-Borel e   então   Demonstração

Define-se:

 

É claro que   para todo ponto   em  

Agora constróem-se os abertos:

  ou seja, a bola de centro y e raio  

Eles formam uma cobertura para  

 

Usando a propriedade de Heine-Borel, estabelecemos a existência de um conjunto finito de pontos   tais que:

 

Da simples definição de   sabemos que eles são disjuntos das bolas centradas em   de raio  

 

Define-se:

 

temos:

 

Tomando a união, temos:

 

O que completa a demonstração.

Todo conjunto de Heine-Borel é fechado

Seja K um conjunto com a propriedade de Heine-Borel e seja   pelo lema anterior   e, portanto,   isso significa que:

 

e portanto K é fechado.

Todo conjunto de Heine-Borel é limitado

Seja K um conjunto com a propriedade de Heine-Borel. Considere a seguinte cobertura de K:

 

Da propriedade de Heine-Borel, podemos extrair uma subcobertura finita tal que:

 

Logo K é limitado.

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