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Palavras
editarAgora, você começará a criar palavras. Nesse momento, existem dois fatores importantes: a simplicidade e a especificidade. Quanto mais específico você tentar ser, mais complicada a língua parecerá. Porém, se você tentar reduzir demais o número de palavras, as frases ficarão muito pouco específicas podendo inclusive resultar em grandes problemas práticos. Você precisa se fazer algumas perguntas para saber que palavras usar.
A primeira pergunta é se a sua língua possuirá adjuntos, aquelas palavras que ficam junto de outra, caracterizando-a, ou seja, adjetivos, advérbios e artigos. Não é difícil de eliminar adjetivos e advérbios, e existem algumas línguas aonde eles não existem, como o árabe. No árabe, as únicas classes que existem são nomes, verbos ou preposições. Assim, ao invés de dizer "o homem correu lentamente", deve-se dizer "o homem correu [com] lentidão", e ao invés de "a parede vermelha", deve-se dizer "a parede [de] vermelho".
Artigos também não são muito necessários. No caso de "o homem correu lentamente", o artigo está indicando que "homem" se refere a algum homem já referido anteriormente. Se você diz "um homem correu lentamente", então pode ser qualquer homem, e quando você diz "homem corre lentamente" parece que todos os homens correm lentamente. Mesmo assim, você pode usar pronomes, como "aquele homem", "algum homem" ou "todos os homens" se você quiser. O russo e outras línguas soviéticas ou asiáticas se dão bem sem artigos.
Kevin poliva tsvetov.
Kevin está regando [aquelas] flores.
Você pode deixar de usar o verbo "ser" em orações nominais, como o russo também faz. A frase "a parede é vermelha" fica somente "parede vermelha". O verbo "ser" só seria utilizado em orações do tipo "então é isso!".
Outra coisa que você se deve perguntar é como serão as conjunções. Elas ligam as orações umas às outras, formando uma lógica, mas às vezes essas conecções já estão subentendidas. Por exemplo, ao invés de "nos aproximamos do fogo porque estava frio", podemos dizer "estava frio, nos aproximamos do fogo". A lógica fica implícita. Porém, existem algumas conjunções que ficam difíceis de substituir: que, se, ou, qual, quanto, como, etc. Normalmente, as conjunções coordenativas, que ligam duas orações independentes, são dispensáveis, enquanto as conjunções subordinativas, que unem uma oração principal a uma subordinada, não podem ser retiradas sem causar confusão.
Depois disso, você precisa escolher que pronomes você vai usar. Nas línguas românicas, prefere-se flexionar o verbo ao invés de usar pronomes pessoais, como "vi-lo" em vez de "eu vi ele". Se você vai flexionar ou deixar palavras separadas, como eu já disse, depende do sistema de escrita. Se a sua língua for sintética, o melhor é conjugar o verbo e deixar os pronomes de lado, mas se sua língua é analítica você vai precisar dos pronomes. Você pode criar vários pronomes pessoais diferentes para distinguir gênero, número, formalidade, se é uma pessoa, um animal ou um objeto. Lembre-se também que existem outros pronomes além dos pessoais, como "que", "isso", "esse", "algum", "nenhum", "todos", "outro", etc.
O passo seguinte é decidir como serão os números. Os nossos números são baseados em dezenas, por causa que temos dez dedos nas duas mãos. A base dez é a mais falada no mundo, mas as bases dois, oito, doze, dezesseis e vinte também são populares. Os sumérios criaram a base 60, que é usada hoje para medir o tempo e os ângulos. Essa base é muito útil porque o 60 tem muitos divisores, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 10, 12, 15, 20, 30 e 60, o que facilita bastante as contas. A única desvantagem é ter que aprender todos os 60 números, mas isso não é tão difícil. Em uma língua de base dez, o normal é ir contanto até o dez, então depois do dez vem "dez-um", "dez-dois", "dez-três", e assim vai. Porém, existem várias outras maneiras de contar. O número quarenta e três, por exemplo, pode ser escrito "quatro-três", "três-e-quarenta", "quatro-dez-três" ou "oito-cincos-e-três". Algumas línguas dão aos números nomes relacionados ao processo de contar com as mãos. Por exemplo, cinco pode ser "mão", onze pode ser "desce-aos-pés" e vinte pode ser "homem".
Síntese
editarA próxima coisa a decidir é como você vai indicar coisas como número, caso, gênero, etc. Podemos fazer essa transformação de várias formas, como vimos anteriormente. Podemos flexionar a palavra ou pegar uma nova palavra e fundir as duas, aglutiná-las ou deixar as duas separadas. Ao contrário do português, muitas línguas não flexionam os adjuntos de acordo com o substantivo, simplesmente porque não é necessário indicar a condição do nome que o adjunto está caracterizando se ela já está indicada no próprio nome.
Vamos começar a pensar na flexão de número. Normalmente, é necessário indicar se o substantivo está no singular ou no plural em um idioma. Mas não precisamos disso em todos os casos. No mandarim, por exemplo, quando a gente fala em um número grande e indefinido de coisas, não usamos nenhum afixo. Pelo contrário, quando estamos nos referindo a um número preciso de coisas, precisamos indicar isso com uma espécie de palavra auxiliar, chamada de quantificador. A dor de cabeça no mandarim é que, por algum motivo, os substantivos não são todos quantificados da mesma forma. Existem vários quantificadores diferentes, ou seja, quando você aprende uma palavra nova também precisa aprender como quantificá-la.
Kevin zài chōng huā.
Kevin agora rega flores.
Em algumas línguas, como o árabe, gaélico e lituânio, existe também o número dual, que indica um conjunto de duas coisas. Certos idiomas não indicam o dual no substantivo, mas possuem um pronome dual. No português, quando falamos "nós", não se sabe se estamos falando de "eu e tu", "eu e vós", "eu e ele" ou "eu e eles". Pronomes duais podem ajudar nesse sentido.
A próxima coisa a decidir é o caso. Nós não indicamos a condição de caso no português, mas essa flexão já existiu em algumas línguas antigas, como o latim, o sânscrito e o grego. Ela ainda está presente no Russo, por exemplo, e também foi incorporada ao Esperanto. Ela indica qual é a função do nome, o que permite que a ordem da frase seja quebrada. Muitas pessoas odeiam os casos, pois são desnecessários e tornam a língua bem mais difícil. Naquele nosso exemplo, "Kevin" está no caso nominativo, pois está exercendo a função de sujeito, realizando a ação, enquanto "flor" está no caso acusativo, pois está exercendo a função de objeto, sofrendo a ação.
Em seguida, você precisa decidir se os substantivos da sua língua terão gêneros. Claro, substantivos como "homem", "mulher, "cavalo" e "égua" podem facilmente ser classificados como masculinos ou femininos, mas fica mais complicado quando se decide fazer isso com os objetos, como faz o português, o alemão e o francês. Não faz muito sentido dizer se objetos inanimados são masculinos ou femininos, mas esse hábito persistiu na nossa língua ao longo do tempo. Nem sempre os gêneros são feminino e masculino. Em várias línguas também existem gêneros para animais, seres humanos, seres abstratos, etc. Alguns idiomas podem ter até vinte gêneros.
Também é importante pensar em como serão os afixos para os nomes. No português, muitos deles são cheios de afixos de diferentes tipos.
- incapaz
- desordem
- gorduroso
- confiável
- cinéfilo
- cinófobo
- paranaense
- lentamente
Claro que, se você estiver fazendo uma língua sintética, não vai usar afixos. A palavra "aspirador" ficaria "aquele-que aspira", por exemplo. Adicionar afixos ou pequenas palavras para mudar o significado de um nome é muito eficiente, pois isso poupa o trabalho de criar novas palavras. E quanto menos palavras, menores elas podem ser.
Depois de anotar quais palavras você quer, pode começar a construí-las. É bom tentar traduzir as palavras para várias outras línguas antes de inventar a sua. Naquele nosso exemplo, a tradução para o inglês do verbo "regar" é "water", que também pode significar "água". Assim, você poderia ter a idéia de criar uma mesma palavra para "regar" e "água". Pesquise também a etimologia das palavras. Quanto mais você conhecer das outras línguas, melhor será a sua. Crie figuras de linguagem, como "a todo vapor" ou "não ir com a cara de". Pesquisa também as expressões e ditados populares de outras línguas.
Lembre-se de que a história das palavras nem sempre é óbvia. Veja um exemplo: na Idade Média, a educação superior compreendia sete disciplinas. Estas eram divididas em dois grupos, o "trívium", que continha três disciplinas, e o "quadrívium" que continha as outras quatro. No quadrívium era ensinado aritmética, geometria, música e astronomia. Era considerado muito difícil, e temido pelos estudantes. Antes de chegar nele, tinha-se que passar pelo trívium, o básico, que era ensinado nos primeiros anos da faculdade, onde era estudado somente gramática, lógica e retórica. Daí vem a palavra "trivial", do português. Se você estiver construindo uma língua alienígena, invente também a história dos seus extraterrestres quando for construir palavras.