Medida e integração/Imprimir



Este material está sendo elaborado com base nas notas de aula da disciplina Medida e Integração, do programa de Doutorado em Matemática do IME, ministrada pelo professor Alfredo Jorge Aragona Vallejo, no primeiro semestre letivo do ano de 2009.

O conteúdo do livro não precisa (nem deve) se limitar àquele que consta atualmente no índice. Sendo assim, a qualquer momento o livro pode ser revisto e ampliado.

Sinta-se a vontade para ler este ou quaisquer outros livros do projeto, melhorando-os conforme lhe for possível. Com isso estará ajudando a aumentar a quantidade e a qualidade dos textos didáticos disponíveis em língua portuguesa, ao mesmo tempo em que colaborará com o crescimento projeto Wikilivros como um todo.

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No decorrer deste texto algumas notações serão usadas com bastante frequência. Por este motivo, este capítulo é destinado a esclarecer tais notações.

Conjuntos numéricos

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Os conjuntos de números mais conhecidos serão denotados de maneira usual:

  • é o conjunto formado pelos números que se usa para contar, ou seja, os números naturais:
  • é o conjunto que contém todos os números inteiros, ou seja, os números naturais e seus opostos:
  • é o conjunto formado pelos números racionais, ou seja, as frações positivas e negativas com numerador e denominador inteiros:
  • denota o conjunto dos números reais, que é formado pela união dos números racionais com os números irracionais;
  • denota o corpo dos números complexos;

Adicionalmente, quando for mencionada uma propriedade que vale tanto para o corpo quanto para o corpo será usada a notação para não ser necessário mencionar ambos os conjuntos. Sendo assim, sempre que você encontrar ao longo do texto, lembre-se que o mesmo pode ser trocado por ou por sem prejuízo algum.

Operações entre conjuntos

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Às vezes, ao se definir um conjunto (ou um conceito qualquer ) em termos de uma expressão , é conveniente abreviar a afirmação " é definido como sendo " denotando-a simplesmente como:

.

Em alguns livros, você pode encontrar também as notações e mas neste texto elas não serão utilizadas.

Se for qualquer um dos conjuntos ou indica-se que o zero foi removido de tal conjunto usando-se a notação Em símbolos, isto se expressa como:

Se e são conjuntos, então:

  • denota a cardinalidade do conjunto (ou a quantidade de elementos em ). Quando é finito, escreve-se ;
  • é a interseção dos conjuntos e
  • é a união dos conjuntos e
  • denota a diferença entre os conjuntos e
  • Se o conjunto é chamado de complementar de em relação a e passa a ser denotado por No entanto, alguns autores[1] preferem manter a notação
  • Quando ficar claro pelo contexto qual é o conjunto pode-se omiti-lo na notação Nesses casos, escreve-se apenas (o complementar de ). Com esta notação, tem-se Em alguns livros, encontram-se também as notações ou ainda [2]
  • é a diferença simétrica entre e
  • é o conjunto das partes de ou seja, o conjunto dos subconjuntos de
  • é o conjunto das partes finitas de


Se e são conjuntos não-vazios, então uma família em indexada por é simplesmente qualquer aplicação Os elementos de são chamados de índices e conjunto é então um conjunto de índices. A família é denotada por ou, quando o conjunto de índices ficar claro pelo contexto, simplesmente por

Alguns autores preferem usar ou no lugar de Ocasionalmente isto poderá acontecer ao longo deste wikilivro.

Se é enumerável, ou seja, se existe uma correspondência biunívoca de com a família é chamada de sequência em indexada por . Se é finito, a família é chamada de sequência finita em indexada por

Se é uma família em indexada por enumerável ou não, então:

  • A união arbitrária dos quando percorre é o conjunto
  • A intereseção arbitrária dos quando percorre é o conjunto

Se , a união arbitrária dos quando percorre é

e a intereseção arbitrária dos quando percorre é

Analogamente, se , então:

Do mesmo modo, escreve-se

Convenção

Se então e

Referências

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  1. DiBenedetto (2002)
  2. Royden (1988).


Introdução

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Nos cursos básicos de cálculo, aprende-se que a integral está intimamente relacionada com a noção de área que se conhece desde o ensino fundamental. A teoria da integração tem em suas raízes os trabalhos de matemáticos gregos como Eudoxo e Arquimedes, que viveram alguns séculos antes de Cristo.[1] Naqueles tempos, eles já eram capazes de calcular áreas e volumes por meio do método de exaustão, no qual se decompunha um todo em infinitas partes cuja área ou volume fossem quantidades conhecidas.

O maior avanço em relação a integração veio somente no século XVII, com a descoberta do teorema fundamental do cálculo, feita independentemente por Newton e Leibniz. No entanto, mesmo nesta época a teoria da integração carecia de uma formulação rigorosa. Foi Riemann quem, no século XIX, trouxe uma formalização da noção de integral através do uso de limites. Hoje em dia, os cursos de cálculo trazem tradicionalmente as ideias e propriedades mais relevantes da integral de Riemann[2].

Apesar de sua popularidade, a teoria de integração desenvolvida por Riemann tem algumas deficiências que se tornam evidentes quando se precisa estudar sequências de funções integráveis ou mesmo séries de tais funções. O exemplo notável surge ao considerar uma sequência de funções integráveis à Riemann que em cada ponto converge para um valor Geralmente, quando se tem uma sequência convergente (no caso, e uma operação sendo feita sobre cada um de seus termos (no caso o cálculo da integral de Riemann), é importante poder "comutar o limite e a operação". No exemplo citado, seria interessante que valesse a seguinte igualdade:

Usando-se a integral de Riemann, para se ter garantia desta propriedade é preciso exigir muito mais do que a convergência pontual: Se a sequência for uniformemente convergente, pode-se comutar o símbolo da integral com o do limite.[3]

Henri Lebesgue, em 1902 desenvolveu em sua dissertação[4] uma teoria de integração mais elegante, preenchendo as grandes lacunas na teoria de integração de Riemann. Devido a importância daquele trabalho, a teoria é hoje chamada de Integração de Lebesgue.

O conceito de mensurabilidade

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Quando se estuda topologia, um conceito que está sempre presente é o de função contínua. As funções contínuas tem várias propriedades interessantes e são fundamentais no estudo de espaços topológicos. Em contrapartida, no desenvolvimento da teoria de integração, certo tipo de funções, as chamadas funções mensuráveis, também têm grande importância. Estas funções possuem algumas características em comum com as funções contínuas, e isto ficará evidente conforme forem deduzidas algumas de suas propriedades.

Ao se definir o que são funções contínuas, é levada em consideração a forma como estas funções se comportam em relação a certos subconjuntos de seu domínio e seu contradomínio. Para ser mais exato, se diz que uma função é contínua quando a pré-imagem (ou imagem inversa) de qualquer aberto do seu contradomínio é um conjunto aberto do seu domínio[5]. De forma análoga, definem-se as funções mensuráveis considerando o comportamento destas funções em relação a conjuntos abertos do contradomínio e um outro tipo de subconjuntos do seu domínio: os conjuntos mensuráveis.

Apesar de ainda não ter sido dito o que é uma medida, esta é uma ideia que aparece em contextos bastante simples, como é o caso dos intervalos numéricos da reta de números reais. Intuitivamente, pode-se dizer que o comprimento do intervalo é igual a ou ainda, a distância de até Os intervalos são exemplos típicos de algo que se gostaria de poder "medir". Seria igualmente interessante poder medir as uniões finitas de intervalos, e também ser capaz de fornecer a medida da diferença entre dois intervalos. Propriedades como estas servem de motivação para se definir as -álgebras de conjuntos e em sequência a noção de mensurabilidade.

Definição 1.1

Dado um conjunto diz-se que uma coleção de subconjuntos de é uma -álgebra sobre se satisfaz as seguintes condições:

  1. Se então
  2. Se é uma sequência em então

Observações

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  • Obs. 1.2: Conforme já foi dito, será usada a notação para denotar o complementar de em relação a sempre que o contexto deixar claro qual o conjunto em questão. Em particular, isto se aplica ao segundo item da definição de -álgebra. Assim, a propriedade 2 diz que se pertence a uma -álgebra, então também pertence.
  • Obs. 1.3: Decorre diretamente da definição que o conjunto vazio pertence a qualquer -álgebra, pois e [ver nota 1]
  • Obs. 1.4: Utilizando as leis de De Morgan, obtém-se uma propriedade equivalente à terceira exigência da Definição 1.1, mas que envolve uma interseção enumerável:

3'. Se é uma sequência em então

  • Obs. 1.5: Se é uma sequência finita em então

e

  • Obs. 1.6: Se e então De fato, sendo tem-se

[ver nota 2]

Como se poderia imaginar a partir dos comentários que precederam a definição definição de -álgebra, os conjuntos mensuráveis serão aqueles que verificam as propriedades acima. De forma mais precisa:

Definição 1.7

Se é uma -álgebra sobre o par ordenado é chamado de espaço mensurável e os elementos de são denominados conjuntos mensuráveis.

  • Obs. 1.8: É comum cometer um abuso de linguagem e se referir ao "espaço mensurável " sem mencionar a -álgebra como por exemplo ao dizer "o espaço mensurável ". Obviamente, isto só será feito quando ficar claro qual a -álgebra em questão. A situação análoga no contexto da Topologia é falar de um espaço topológico sem mencionar sua topologia, como em " é um espaço topológico".[ver nota 3]

Finalmente, uma vez caracterizados os conjuntos mensuráveis, a noção de mensurabilidade pode ser definida também para funções:

Definição 1.9

Se é uma função para a qual é um espaço mensurável[ver nota 4] e é um espaço topológico[ver nota 3], diz-se que é uma função mensurável ou aplicação mensurável se para cada aberto de sua imagem inversa for um conjunto mensurável.[6]

O próximo resultado mostra uma forma de se obter funções mensuráveis quando já se conhece uma função mensurável e uma contínua: basta realizar sua composição, aplicando primeiro a função mensurável e por último a função contínua.

Proposição 1.10

Sejam um espaço mensurável[ver nota 4], e espaços topológicos e uma aplicação mensurável. Se é uma função contínua então é uma aplicação mensurável.[7]

Demonstração
Se é um aberto em então é aberto em pois é contínua. Consequentemente, é um conjuntos mensurável, pois é mensurável e é aberto.

Um resultado análogo ao anterior, que pode ser aplicado quando se tem uma função contínua a duas variáveis reais (ou a uma variável complexa), é mostrado a seguir.

Proposição 1.11

Sejam um espaço mensurável[ver nota 4], e espaços topológicos, onde a topologia de é a usual. Se são aplicações mensuráveis e é uma função contínua então definida por é uma aplicação mensurável.

Demonstração
Considere a função definida por Então e pela proposição anterior, basta mostrar que é mensurável. Para isto, considere um aberto de Suponha inicialmente que é um retângulo cujos lados são paralelos aos eixos, ou seja, com e sendo intervalos abertos de Neste caso, tem-se

Como e são funções mensuráveis, e tanto quanto são conjuntos abertos, tem-se e mensuráveis. Mas a interseção finita de conjuntos mensuráveis é um conjuntos mensurável (ver observação anterior), então é mensurável.

Se for um aberto arbitrário do espaço existe uma família enumerável de retângulos abertos em com lados paralelos aos eixos, de tal modo que Deste modo,

Uma vez que se escreve como uma união enumerável de conjuntos mensuráveis, conclui-se que ele é mensurável (conforme a terceira propriedade que define uma -álgebra).

Como consequência imediata desta proposição, tem-se o seguinte:

Corolário 1.12

Sejam um espaço mensurável[ver nota 4] e um espaço topológico[ver nota 3] (com sua topologia usual[8]). Se são aplicações mensuráveis, então é uma aplicação mensurável.

Demonstração
Segue da proposição anterior, com e pois neste caso

para qualquer

Um outro resultado imediato que trata especificamente da mensurabilidade de funções de uma variável complexa é o seguinte:

Corolário 1.13

Sejam um espaço mensurável[ver nota 4] e um espaço topológico[ver nota 3] (com sua topologia usual[8]). Se é uma aplicação mensurável então são aplicações mensuráveis.

Demonstração
Primeiramente, para garantir que é mensurável, basta observar que onde é dada por é uma função contínua. Então, como é a composição de uma função contínua com uma mensurável, também é mensurável.

De forma análoga, observa-se que onde é dada por também é uma função contínua. Pelo mesmo argumento segue que é mensurável.

Com o mesmo raciocínio mostra-se que é mensurável, pois a função é contínua e

Além do que já foi mostrado até o momento, no conjunto das funções mensuráveis que tomam valores em um corpo também verifica uma propriedade muito frequente em matemática: o fechamento em relação a soma e o produto. Uma consequência disto é que um polinômio em funções mensuráveis continua sendo mensurável e, em particular, a multiplicação de uma função mensurável por uma constante (ou se preferir, um escalar) também é mensurável. O resultado que garante estas propriedades é apresentado a seguir.

Corolário 1.14

Sejam um espaço mensurável[ver nota 4], um espaço topológico[ver nota 3] (com sua topologia usual[8]) e Se são mensuráveis então e são mensuráveis.

Demonstração
;Caso 1

Se basta observar que a função de duas variáveis reais é contínua e que

portanto, é mensurável (conforme a Proposição 1.11).

Do mesmo modo, tomando tem-se novamente uma função de duas variáveis que é contínua e tal que

Donde se conclui pela mesma proposição que é mensurável.

Considerando a função constante definida por tem-se mensurável. De fato, seja um aberto de Então e ambos estes conjuntos são mensuráveis.

Assim, considerando que

para qualquer tem-se igual ao produto de duas funções mensuráveis e, portanto, é também mensurável. Em particular, quando conclui-se que é mensurável.

Caso 2

Se considere e as partes reais de e respectivamente. Do mesmo modo, sejam e as partes imaginárias de e respectivamente. Isto significa que e e consequentemente e

Conforme já foi demonstrado, se e forem funções mensuráveis, tem-se e mensuráveis. Pela demonstração do caso 1, as somas e são mensuráveis. Logo é mensurável. Do mesmo modo, segue do caso 1 que e são mensuráveis, portanto também é.

Finalmente, a mensuralidade de no caso complexo segue da mensurabilidade do produto de funções complexas recém provada, usando o mesmo argumento do caso real.

é mensurável

munido das operações pontuais de adição, multiplicação e multiplicação por escalar, é uma -álgebra (ou também uma sub -álgebra de ).

Definição 1.16

Dado um conjunto e a função característica de é a função definida por

Obs. 1.17: Note que o domínio da função característica de é e não

O próximo resultado mostra que um conjunto é mensurável se, e somente se, a sua função característica for mensurável (se vista como uma função que toma valores em Por simplicidade, a função definida por em cada elemento de também será denotada pelo símbolo ficando implícito que o contradomínio é o conjunto dos números reais ao se falar sobre a sua mensurabilidade. Além disso, como já foi dito, se não for feita indicação em contrário será considerada a topologia usual de

Proposição 1.18

Dado um espaço mensurável e as seguintes afirmações são equivalentes

  1. é mensurável;
  2. é uma função mensurável;

Demonstração
Assuma primeiramente que é mensurável. Se é um subconjunto aberto de então ou No primeiro caso, tem-se que é mensurável[ver nota 5]. No segundo caso, tem-se:

Segue da definição de -álgebra que é mensurável e, como é mensurável (por hipótese), também resulta que é mensurável. Isto significa que é sempre mensurável quando é um aberto. Portanto, é uma função mensurável.

Reciprocamente, se é uma função mensurável. Tomando o aberto igual ao intervalo tem-se [ver nota 6]. Então é mensurável pois, por hipótese, a função característica de é mensurável.

Proposição 1.19

Dado um espaço mensurável e uma função mensurável existe uma função mensurável tal que para todo e

Demonstração
Esta demonstração é deixada a cargo do leitor. Sinta-se livre para melhorar a qualidade deste texto, incluindo-a na versão online deste material.

A seguir, é demonstrado um a interseção de uma família de -álgebras é ainda uma -álgebra.

Lema 1.20

Se é um conjunto não-vazio e é uma família[ver nota 7] de -álgebras sobre então é uma -álgebra sobre

Prova
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Proposição 1.21

Se é um conjunto não-vazio e é um de seus subconjuntos, então existe a menor -álgebra sobre que contém

Demonstração
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Definição 1.22

A menor -álgebra sobre que contém é chamada de -álgebra gerada por e denotada por


Exercícios

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Exercício

Demonstre que se obtém uma definição de -álgebra equivalente a que foi dada se for trocada a propriedade 3 por 3', ou seja, se for exigido que a interseção enumerável de mensuráveis seja mensurável (em vez da união enumerável).

Resolução
Basta observar que, pelas leis de De Morgan, e também De fato, supondo que para cada tem-se pela propriedade 2 que para cada Então, se for assumida a propriedade 3' como parte da definição, resulta

Usando a propriedade 2 novamente tem-se

De forma completamente análoga, assumindo 3' como parte da definição, segue a propriedade 3.

Exercício

Mostre que a interseção finita e a união finita são mensuráveis sempre que os conjuntos forem mensuráveis.

Resolução
Basta definir a sequência como:

Então, uma vez que é mensurável, se os conjuntos são mensuráveis, resulta que todos os termos da sequência são mensuráveis.

Então, a propriedade 3 pode ser aplicada para se concluir que é mensurável.

Do mesmo modo, a propriedade 3' implica que é mensurável.

Exercício

Dado um conjunto arbitrário, verifique se os seguintes conjuntos são -álgebras sobre :

Resolução
1. Considere Há três propriedades que devem ser verificadas por para que ele seja uma -álgebra sobre :
  1. Primeiramente, pela própria definição, tem-se
  2. Suponha-se que Pela definição de segue que ou No primeiro caso, A outra possibilidade é que Portanto, tem-se sempre quando
  3. Finalmente, seja é uma sequência em Pela definição de para cada tem-se ou Se for sempre o caso que então Caso contrário, existe algum índice de modo que Neste caso,

Portanto, é uma -álgebra.

2. Deixado a cargo do leitor.

Exercício

Se é um conjunto infinito, é verdade que é uma -álgebra sobre ?

Resolução
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Exercício

Seja é um conjunto arbitrário e Demonstre que é uma -álgebra sobre e que

Resolução
A resolução deste exercício é deixada a cargo do leitor. Sinta-se livre para melhorar a qualidade deste texto, incluindo-a na versão online deste material.


  1. Ver propriedades 1 e 2 da Definição 1.1
  2. Como a propriedade 2 da Definição 1.1 garante que e, pela observação anterior, a interseção desta diferença com está em
  3. 3,0 3,1 3,2 3,3 3,4 A rigor, um espaço topológico é um par onde é uma topologia para o conjunto Para mais detalhes, consulte um dos livros citados nas referências do wikilivro Topologia, por exemplo General topology, de John L. Kelley, página 37.
  4. 4,0 4,1 4,2 4,3 4,4 4,5 4,6 Note que está sendo cometido um abuso de linguagem: a rigor, um espaço mensurável é na verdade um par e não apenas um conjunto No entanto, conforme foi mencionado na Observação 1.9, é costume não explicitar a -álgebra principalmente quando esta puder ser deduzida pelo contexto.
  5. Na Obs. 1.3 se justifica porque o conjunto vazio é mensurável.
  6. Note que qualquer outro conjunto aberto com esta propriedade também serve.
  7. Está sendo suposto que a família é não-vazia, ou seja, que o seu conjunto de índices não é vazio.

Referências

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  1. Conforme introdução do livro "The Elements of Integration and Lebesgue Measure", escrito por Bartle. Ver também a seção History, do artigo sobre integrais na Wikipédia inglesa.
  2. Ver na Wikiversidade a ementa da disciplina "Introdução ao Cálculo".
  3. Este teorema da análise é explicado em detalhes no capítulo sobre Convergência uniforme do wikilivro de Análise real.
  4. Lebesgue (1902)
  5. Para maiores detalhes, pode ser consultado o wikilivro intitulado "Topologia", ou alguma de suas referências.
  6. Alguns autores definem a mensurabilidade de funções a partir de outra propriedade (que será apresentada na Proposição 2.29). Veja, por exemplo, Isnard (2007), pág. 57.
  7. Isnard (2007) apresenta uma versão deste resultado, com e sendo espaços vetoriais normados, no exercício 13 da página 109.
  8. 8,0 8,1 8,2 Conforme K. D. Joshi em seu livro Introduction to General Topology, a topologia usual de é aquela induzida pela métrica euclidiana.


No estudo da teoria da medida, é comum lidar com sequências e séries de funções. Como se sabe da análise real, algumas vezes os termos de uma sequência assumem valores arbitrariamente grandes e este é um dos casos em que se diz que a sequência não converge. Entretanto, em certos contextos é extremamente útil considerar este tipo de sequência como sendo convergente, pois os seus termos "tendem a infinito" ou se "aproximam do infinito". O problema é que o "infinito" não faz parte do conjunto dos números reais, então para que esta noção possa ter um sentido mais preciso, costuma-se definir um novo conjunto a partir dos números reais e dos elementos e de modo que este seja uma extensão da reta real:

Definição 2.23

A reta real estendida é o conjunto

  • Obs. 2.24: Por simplicidade, também poderá ser usada a notação para o elemento de A reta real estendida também costuma ser denotada por

Em capítulos posteriores será considerado frequentemente o subconjunto da reta real estendida definido por

.

Há outros motivos importantes para se considerar o ao longo da teoria da medida, por exemplo:

  • É de interesse poder integrar funções sobre conjuntos que tenham "medida infinita": perceba que tem, intuitivamente, comprimento infinito;
  • Mesmo quando se pretende fazer a integração de funções que tomam valores reais, pode ocorrer que ao considerar uma sequência de funções o valor de ou de seja infinito em alguns pontos Em tais situações, caso não se trabalhe com o , se perde uma parte da elegância e simplicidade dos principais resultados sobre convergência (por exemplo, o teorema da convergência monótona e a "integração termo a termo" de séries de funções). Torna-se então mais conveniente a introdução do símbolo e de algumas convenções para se fazer cálculos envolvendo este símbolo.

Na próxima seção serão definidas algumas estruturas que facilitam o uso de uma relação de ordem, uma topologia e também uma aritmética.

Ordem, topologia e aritmética na reta real estendida

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A retal real estendida se torna um conjunto totalmente ordenado definindo para todo número real . Analogamente, a ordem sobre é induzida ordem de ou seja, para cada se tem

Com esta ordem, se e não é limitado superiormente, isto é, se para todo existe algum tal que então Analogamente, se não é limitado inferiormente, então Deste modo, todo subconjunto não vazio de (e, em particular, de ) tem supremo e ínfimo[ver nota 1] em o que faz da reta real estendida um reticulado completo. Este é um dos principais motivos para a introdução dos símbolos e

A partir desta relação de ordem, defini-se a topologia da ordem sobre Os intervalos abertos são os subconjuntos de que podem ser escritos em uma das seguintes formas:

Deste modo, um conjunto é aberto se for uma reunião de intervalos dos tipos acima (pois eles formam uma base de abertos para ).

Com esta topologia, as noções de limite envolvendo o infinito podem ser definidas de forma unificada a partir da definição topológica de limite.

Observe que ao fazer a interseção de com intervalos abertos de se obtém um intervalo aberto de ou seja, um conjunto da forma ou Levando em conta que estes intervalos formam uma base de abertos para a topologia usual de segue que tal topologia é induzida pela que se definiu sobre anteriormente e que a inclusão é contínua. Do mesmo modo, a topologia usual sobre é a induzida pela topologia usual de

As operações aritméticas de podem ser parcialmente estendidas para da seguinte maneira[1]:

Aqui, significa tanto quanto e significa tanto quanto

Também será convencionado que [2]

Quando se restringe as operações apenas ao conjunto vale:

Por mais estranho que possa parecer a definição de (ou ) como sendo verifica-se facilmente que, com esta escolha, em continuam valendo as propriedades comutativa, associativa e distributiva, sem qualquer restrição. Vale ressaltar, no entanto, que as "leis de cancelamento" devem ser usadas com cuidado, pois:

  • apenas no caso em que
  • somente quando se tem

As expressões e (chamadas de "formas indeterminadas") serão deixadas indefinidas, como é de costume em outros textos da área. As regras acima podem ser intuídas a partir das propriedades usuais de limites que tomam valores infinitos, presentes nos textos de cálculo.

Com as definições dadas, não é um corpo nem mesmo um anel. Apesar disto, ele ainda possui diversas propriedades bastante convenientes:

  • e ou são iguais ou são ambos indefinidos.
  • e ou são iguais ou são ambos indefinidos.
  • e ou são iguais ou são ambos indefinidos.
  • e ou são iguais ou são ambos indefinidos
  • e são iguais se ambos estiverem definidos.
  • Se e se tanto quanto estiverem definidos, então .
  • Se e e tanto quanto estiverem definidos, então .

Em geral, todas as regras usuais de aritmética continuam válidas em desde que todas as expressões envolvidas estejam definidas.

Na próxima seção será considerado uma -álgebra que pode ser definida de modo muito natural a partir da topologia de um conjunto: Se é um espaço topológico, tem-se em particular que Neste caso, conforme se demonstrou na Proposição 1.21 existe a menor -álgebra sobre que contém que é Isto motiva a próxima definição.

Conjuntos de Borel

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Definição 2.25

Seja um espaço topológico. A -álgebra gerada pela topologia é denominada -álgebra de Borel. Qualquer elemento desta -álgebra é chamado de conjunto de Borel de ou boreliano de [3]

  • Obs. 2.26: Quando a topologia estiver subentendida, será dito simplesmente "conjunto de Borel de " ou "boreliano de ". Se não houver risco de confusão, pode-se denotar a -álgebra simplesmente por
  • Obs. 2.27: Considerando que os abertos da topologia são mensuráveis, os seus complementares são também mensuráveis pela propriedade 2 da definição de -álgebra. Consequentemente, as reuniões eumeráveis de conjuntos fechados também são mensuráveis, conforme a propriedade 3 da mesma definição. Além disso, da observação 1.4 segue que as interseções enumeraveis de abertos também são elementos da -álgebra de Borel.

Conforme se aprende em topologia, se e são espaços topológicos, e é uma função contínua, então a pré-imagem de qualquer aberto é um aberto da topologia Neste caso, levando em conta que se conclui que para qualquer Isto significa que é mensurável em relação a e Estas funções mensuráveis recebem os nomes específicos, conforme a próxima definição.

Definição 2.28

Sejam e espaços topológicos. Uma função Borel mensurável é qualquer função contínua Se tais funções são denominadas funções de Borel ou ainda aplicações de Borel.

Proposição 2.29

Seja um espaço mensurável. Se é um espaço topológico e é uma função entre estes espaços, então:

  1. é uma -álgebra sobre
  2. Se é mensurável (em relação a e ) então e para qualquer que seja
  3. Se e para todo então é mensurável.

Demonstração
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A última propriedade da proposição anterior costuma ser usada para verificar se determinada função que toma valores reais é ou não mensurável[4].

A próxima definição apresenta alguns conceitos relacionados a ideia de limite: os limites de oscilação. Sua importância será notada no decorrer do estudo de sequências, tanto numéricas quanto de funções.

Definição 2.30

Seja uma sequência em o limite inferior de é o elemento de dado por

Analogamente, o limite superior de é o elemento de dado por

Proposição 2.31

Uma sequência de é convergente se, e somente se,

Demonstração
Esta demonstração é deixada a cargo do leitor. Sinta-se livre para melhorar a qualidade deste texto, incluindo-a na versão online deste material.

A seguir serão definidas algumas operações que se costuma fazer com funções com imagem na reta real estendida. A essência de tais operações é "tomar um limite em cada ponto do domínio da função". A definição 2.31 formaliza esta ideia:

Definição 2.33

Seja uma sequência de funções definidas em um subconjunto de Definem-se as funções e de em através das fórmulas:

Além disso, se em cada existe define-se o limite pontual da sequência no ponto como sendo:

Proposição 2.39

Seja um espaço mensurável e considere para cada uma função Se é mensurável, para todo então as funções e são mensuráveis.[5]

Demonstração
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Corolário 2.40

Seja um espaço mensurável e considere para cada uma função mensurável Se converge pontualmente para então é mensurável.[6]

Demonstração
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Corolário 2.41

Seja um espaço mensurável. Se e são mensuráveis então as funções e são mensuráveis.[7]

Demonstração
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No desenvolvimento da teoria de integração, será importante considerar os seguintes tipos particulares de funções da forma e

Definição 2.42

Seja um conjunto, uma função e a função nula. A parte positiva de é a função definida por

Analogamente a parte negativa de é a função definida por

Lema 2.45

Seja um conjunto, uma função e a função nula. Então:

  1. Se é um espaço mensurável e é mensurável, então e são mensuráveis;[8][ver nota 2]
  2. Se é um espaço mensurável e tanto quanto são mensuráveis, então e são mensuráveis;
  3. Se com e então e

Demonstração
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Obs. 2.46: O último item do Lema 2.45 pode ser interpretado da seguinte maneira: e são as menores funções não-negativas cuja diferença é Neste sentido, pode-se dizer que a representação é mínima.

  1. Lembre-se que em só os conjuntos limitados possuem esta propriedade
  2. Note que aqui é usada a convenção

Referências

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  1. Ver também: Isnard (2007), pág. 60.
  2. Conforme Isnard (2007), pág. 61, Corolário 5.7.
  3. Ver também Isnard (2007), pág. 116.
  4. Compare a Definição 1.9 com a definição de Isnard (2007), pág. 57.
  5. No livro de Isnard (2007), este teorema corresponde às proposições 5.6 (pág. 61) e 5.10 (i) (pág. 63).
  6. No livro de Isnard (2007), este corolário corresponde ao item (ii) da proposição 5.10 (pág. 63).
  7. No livro de Isnard (2007), este corolário aparece como caso particular do item (ii) na proposição 5.6 (pág. 61).
  8. No livro de Isnard (2007), este item corresponde ao corolário 5.7 (pág. 61).


Em linhas gerais, uma função simples é uma função que assume uma quantidade finita de valores. No contexto da teoria abordada neste livro, a definição de função simples incluirá algumas restrições adicionais, de modo que este nome possa ser usado apenas para se referir ao tipo de específico de função simples que é relevante para a integração.

Definição 3.1

Seja um espaço mensurável. Uma função simples sobre é qualquer função tal que é um conjunto finito.

Exemplo

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A função definida por é uma função simples. De fato, tem-se

Isto significa que que é finito. Observe ainda que

Em geral, se e se definem os conjuntos para cada de a resulta que Note que é uma partição finita de

Por outro lado, sempre que se tem uma partição finita de e uma sequência finita de elementos em de modo que quando a equação define uma função simples. É comum se referir ao segundo membro daquela equação como sendo a representação canônica de

Lema 3.2

Seja um espaço mensurável e a função simples sobre dada por

Então para que seja mensurável é necessário e suficiente que cada seja mensurável, onde

Demonstração
Nesta demonstração, quando será usada a notação para indicar o conjunto .

Primeiramente, supondo que seja mensurável e observando que cada conjunto é aberto em tem-se mensurável. Mas então cada um dos conjuntos é mensurável.

Como o complementar de um conjunto mensurável é mensurável, tem-se mensurável para todo

Reciprocamente, assumindo que é mensurável quando e tomando um aberto de deve-se mostrar que é mensurável. Há dois casos que precisam ser considerados:

A primeira situação só pode ocorrer se que é um conjunto mensurável. No segundo caso, o conjunto é não vazio e é possível escrever Sendo esta uma união finita de conjuntos mensuráveis, conclui-se que é mensurável.

Portanto a função também é mensurável.


Teorema 3.4

Seja um espaço mensurável. Se e é a função nula, então existe uma sequência de funções simples, mensuráveis em de modo que:

  1. para todo
  2. em todo ponto

Demonstração
Para cada pode-se particionar o intervalo em intervalos iguais da seguinte forma:

Considere a pré-imagem por de cada um destes intervalos:

e defina também

A seguir, será demonstrado que a sequência de funções cujos termos são dados por

satisfaz as condições estipuladas no enunciado do teorema. Isto será feito em três etapas:

  1. A sequência é não-decrescente;
  2. A sequência é limitada superiormente por
  3. A sequência converge pontualmente para

Primeiramente, fixe um ponto e um inteiro positivo Para mostrar que observe que:

Como há duas possibilidades:

  1. para algum tal que

Na primeira delas, tem-se e portanto Mas

então deve estar em um destes dois intervalos disjuntos, isto é, ou Se ocorrer então Por outro lado, caso ocorra então

Portanto,

Na segunda possibilidade, tem-se e consequentemente Além disso,

então deve estar em um destes dois intervalos disjuntos. No caso em que isto é, se deduz que A outra alternativa é que e de se conclui que

Usando isto em conjunto com a desigualdade se deduz que existe algum índice tal que e Isto implica que pela própria definição deste conjunto. Logo, Com isto, se conclui a prova de que a sequência é não-decrescente.

Agora, para garantir que basta observar que se e então

  • implica e portanto
  • implica e portanto

Finalmente, em todo ponto De fato, para cada pode ocorrer ou

  • Se então para cada tem-se e consequentemente Logo,
  • Se então existe algum para o qual quando Então para cada um destes valores de tem-se para algum satisfazendo ou seja, Logo, Neste caso,

Assim, para todo tal que

Obs. 3.5: No caso em que é uma função limitada, ou seja, quando existe uma constante para a qual em todo ponto pode-se tomar na prova acima. Nesta situação, a conclusão é que a sequência converge uniformemente para

Com relação as sequências cujos termos estão em tem-se a seguinte propriedade: Se e são sequências não decrescentes em ou seja, e para todo e existem os limites e então

Esta propriedade, juntamente com a Proposição 2.39 e o Teorema 3.4, implicam que se

Proposição 3.6

Se e são funções mensuráveis, então e